Comunidades de São Luís renovam mobilização pela Resex Tauá-Mirim após visita histórica do presidente do ICMBio

Comunidades de São Luís renovam mobilização pela Resex Tauá-Mirim após visita histórica do presidente do ICMBio

Às vésperas da COP-30, petição pela decretação da reserva se aproxima de 70 mil assinaturas e ecoa o apelo das comunidades tradicionais

Sob a copa da grande árvore, comunidades, apoiadores e autoridades se reuniram em torno da esperança e da luta pela Resex Tauá-Mirim. | Foto: Ana Mendes

A luta pela criação da Reserva Extrativista Tauá-Mirim ganha novo fôlego. Em agosto, a comunidade de Portinho, na zona rural de São Luís (MA), recebeu o presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Mauro Pires, em uma visita histórica que marcou um dos momentos mais importantes da mobilização das comunidades tradicionais em 22 anos. O encontro, carregado de simbolismo e vozes ancestrais, renovou esperanças e deu visibilidade à luta contra grandes empreendimentos que ameaçam o território.

O céu cinza e a chuva repentina quebraram a rotina de agosto, mês em que, segundo os moradores, o sol costuma reinar. A mudança climática coincidiu com a abertura da roda de conversa conduzida por Rosana Mesquita, liderança da comunidade, que lembrou que a criação da Resex Tauá-Mirim é mais do que proteger a natureza humana: é cuidar de todos os seres.

Rosana Mesquita, da comunidade Rio dos Cachorros, conduz a roda de conversa e lembra que proteger a Resex é cuidar de todos os seres. | Foto: Ana Mendes

“Os mais velhos dizem que a chuva é bênção, mas hoje ela também nos alerta que as mudanças climáticas já estão em curso e que temos a responsabilidade de cuidar dessa terra”, disse Rosana, dando o tom de um encontro que reuniu dezenas de moradores, representantes de movimentos sociais, sindicatos, universidades, apoiadores da causa socioambiental e autoridades, entre elas Mauro Pires, presidente do ICMBio.

Agora, em setembro, a mobilização se amplia com força ainda maior. A petição pela decretação da Resex se aproxima de 70 mil assinaturas, transformando o apelo local em um coro que ecoa em São Luís, no Brasil e no mundo. Mais do que uma reivindicação territorial, a Resex Tauá-Mirim se afirma como bandeira de justiça socioambiental e como território vivo e estratégico para a Amazônia costeira.

Vozes da resistência

Na roda de diálogo, a memória e a experiência das comunidades deram corpo à luta. Lucilene Silva, da comunidade de Cajueiro, recordou a lógica predatória dos grandes empreendimentos que ameaçam o território:

“Prometem riquezas, mas eles vêm tirar nossas riquezas. Não precisamos desses empreendimentos. Nós já somos ricos; nossos quintais têm tudo que precisamos para viver.”

Representante do ICMBio relembra seu contato com Maria Máxima e reconhece a importância da Resex como pulmão de São Luís e símbolo de resistência. | Foto: Ana Mendes

Também ecoou a lembrança de dona Máxima Pires, liderança da comunidade Rio dos Cachorros, falecida vítima de câncer, mas que deixou uma marca profunda na luta:

“A Resex Tauá-Mirim é o pulmão de São Luís”, dizia em suas últimas falas públicas.

Para os presentes, sua ausência física foi compensada pela presença simbólica de sua voz, lembrada como guia espiritual da mobilização.

Visita inédita: um dia que entra para a história

A ida do presidente do ICMBio à comunidade de Portinho foi considerada um marco histórico. Pela primeira vez em anos, a principal autoridade federal responsável por criar e gerir unidades de conservação esteve no território, ouvindo diretamente das comunidades suas demandas, denúncias e propostas.

“Essa presença é simbólica e prática. Simbólica porque reconhece a legitimidade da luta; prática porque aproxima a tomada de decisão da realidade vivida aqui”, avaliou Fran Gonçalves, liderança da comunidade Taim e integrante do Conselho Gestor da Resex.

Fran Gonçalves, liderança da comunidade Taim, reforça que a Resex é uma conquista necessária para garantir vida e futuro às comunidades da Ilha. | Foto: Ana Mendes

O encontro no Portinho foi marcado por falas potentes, cantorias e um almoço coletivo, fortalecendo os laços entre as comunidades e os aliados presentes. Ao final, a chuva que caiu naquele dia não foi coincidência, mas um recado de que a luta pela Resex Tauá-Mirim segue viva e capaz de ecoar até Brasília e para o mundo.

Durante o encontro, Mauro Pires declarou:

“É uma honra estar aqui, entre vocês, ouvindo as histórias, os saberes e a memória ancestral que fazem desse conjunto de comunidades, que se reconhece como Resex Tauá-Mirim, antes mesmo da sua decretação, um território único. O ICMBio reconhece o valor ambiental, cultural e social deste território e vê na proposta da Resex Tauá-Mirim uma oportunidade de garantir o uso sustentável dos recursos, proteger a biodiversidade e fortalecer os modos de vida tradicionais. Estamos atentos e comprometidos a trabalhar junto às comunidades para que este sonho de décadas se torne realidade, garantindo justiça socioambiental, proteção do mangue e o bem-estar das gerações presentes e futuras.”

22 anos de espera

A proposta de criação da Resex Tauá-Mirim nasceu em 2003, construída pelas próprias comunidades tradicionais. Quatro anos depois, em 2007, os estudos técnicos do ICMBio confirmaram a viabilidade da unidade de conservação de uso sustentável, voltada a proteger modos de vida como a pesca artesanal, o cultivo no roçado e o manejo do mangue.

Desde então, o decreto presidencial que oficializa a Resex aguarda assinatura, enquanto o território enfrenta pressões crescentes de empreendimentos que ameaçam o mangue, a biodiversidade e a qualidade de vida das 12 comunidades que compõem a área.


Mangue, clima e futuro

A criação da Resex é estratégica para garantir a continuidade de recursos naturais essenciais, como peixes, mariscos, água limpa e terra para plantio, além de funcionar como barreira contra a destruição ambiental.

Com a COP-30, marcada para novembro em Belém (PA), as lideranças destacam que decretar a Resex Tauá-Mirim seria um gesto concreto de compromisso do Brasil com a justiça climática e a soberania dos povos tradicionais.

O professor Horácio Antunes, do GEDMMA/UFMA, destaca a importância de que a pesquisa acadêmica caminhe junto às comunidades em defesa do território. | Foto: Ana Mendes

“O direito de viver está sendo roubado. Todos os dias somos saqueados. Isso não afeta só quem vive na Resex, mas toda a Ilha de São Luís e o mundo”, reforçou Rosana Mesquita.

Petição pela Resex Tauá-Mirim será encerrada: último chamado à mobilização

Lançada em 26 de abril de 2025, a petição pela decretação da Resex Tauá-Mirim será encerrada em 30 de setembro. Com quase 70 mil assinaturas, a iniciativa transformou o apelo das comunidades tradicionais em um coro que ecoa por São Luís, pelo Brasil e pelo mundo.

A Resex Tauá-Mirim se afirma como símbolo de resistência na capital maranhense e como uma bandeira que conecta o local e o global: um território vivo que clama por reconhecimento, proteção e futuro.

As lideranças reforçam que cada assinatura faz diferença na luta pelo reconhecimento do território, essencial para a preservação da biodiversidade, a pesca artesanal e o modo de vida das 12 comunidades que compõem a reserva.

Quem ainda não assinou pode contribuir com a causa e fortalecer a mobilização: [clique aqui e assine a petição].

Com raízes firmes, Tauá-Mirim segue mobilizando pela criação da Resex

Com raízes firmes, Tauá-Mirim segue mobilizando pela criação da Resex

Comunidade na zona rural de São Luís reforça campanha por justiça ambiental e articula ações para o dia de lançamento e a Feira da Resex, mesmo diante dos impactos de grandes empreendimentos.

Fotos: Campanha Resex Tauá-Mirim Já

No último sábado, 5 de abril, a comunidade de Tauá-Mirim, na zona rural de São Luís (MA), recebeu uma visita de articulação e escuta como parte da mobilização pela campanha “Resex Tauá-Mirim Já”. A atividade teve como foco fortalecer o diálogo com os moradores sobre a urgência da criação da Reserva Extrativista e articular os preparativos da comunidade para a Feira da Resex, prevista para acontecer ainda neste mês.

A ação envolveu representantes de diversas organizações parceiras, entre elas o Grupo de Estudos: Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente (GEDMMA), a Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), a Associação Tijupá e a Justiça nos Trilhos (JnT).

A acolhida foi calorosa. Os visitantes foram recebidos pelos moradores e pelo padre Brayan, da Paróquia de Boa Viagem, que celebrava a missa naquele dia. Antes da celebração, foram distribuídos panfletos informativos da campanha. Ao final da missa, Alberto Cantanhede (Beto – Taim), pescador e integrante do Movimento Nacional dos Pescadores (Monape) e da Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas e Povos Tradicionais Extrativistas Costeiros e Marinhos (Confrem), compartilhou com os presentes os objetivos da campanha e reforçou o convite para o lançamento oficial, no dia 26 de abril, no centro de São Luís.

“Trata-se de um território historicamente ocupado por famílias que vivem do extrativismo, da pesca artesanal e da agricultura familiar. A criação da Resex é fundamental para proteger essas formas de vida e garantir justiça ambiental para os povos e comunidades tradicionais da Ilha”, destacou Beto.

A fala foi reforçada pelo padre Brayan, que relacionou a defesa da Resex com os princípios da Campanha da Fraternidade 2025, propondo uma reflexão profunda sobre a ecologia integral. Em sintonia com os apelos do Papa Francisco, o padre também gravou um vídeo de apoio à campanha.

Em paralelo, estão sendo realizados diálogos e visitas in loco às áreas produtivas onde se observam os impactos da poluição na produção de frutas nativas e cultivadas nos quintais, nos roçados, bem como na atividade pesqueira e na coleta de mariscos. As visitas revelaram a urgência de enfrentar os danos provocados por grandes empreendimentos nos territórios da zona rural da capital. Carlos Pereira, da Associação Tijupá, destacou os prejuízos diretos à produção de frutas na comunidade:

“Tauá-Mirim, a exemplo das demais comunidades da Resex, tem uma grande diversificação na produção, mas também é impactada pelos efeitos perversos da poluição provocada pelos grandes projetos nesse território. Observamos que ela tem sido uma das mais atingidas, especialmente em termos de perda na produção de frutas, tanto nas espécies plantadas — como os vastos bananais, que praticamente desapareceram devido a uma doença — quanto nas frutas nativas, muitas com perda total. Vale lembrar que, há pouco tempo, a comunidade levava polpa de frutas para a Feira da Resex. Hoje, infelizmente, isso já não é mais possível”, relatou.

Mesmo diante das dificuldades, os moradores receberam com entusiasmo a proposta de se reorganizar para a Feira da Resex, espaço de celebração da resistência e dos saberes tradicionais. Uma comissão local será formada para garantir que Tauá-Mirim esteja representada com sua memória viva — mesmo que muitos de seus frutos não estejam mais presentes.

A visita foi encerrada com uma foto coletiva e a gravação de vídeos em apoio à campanha. Com gestos simples e firmes, Tauá-Mirim reafirma seu lugar na história de luta pelo reconhecimento dos territórios tradicionais da Ilha, transformando dor em mobilização e cuidado em resistência.