LONDRES — A linha dura da Vale Inco Ltd. com relação aos grevistas de suas operações de níquel em Sudbury, Província de Ontario, Canadá, é uma tentativa de quebrar os sindicatos canadenses, de acordo com fontes do mercado.
“O que se ouve é que a Vale está tentando quebrar o sindicato totalmente e talvez já tenha conseguido,” disse um trader de níquel.
O tamanho e as perspectivas da Vale SA, combinados com uma situação em que os armazéns da Bolsa de Metais de Londres (LME) estão bem estocados e os preços do níquel estão inesperadamente altos, dão à empresa brasileira a oportunidade de lidar com os sindicatos a partir de uma posição de força, disseram as fontes.
“A Vale é uma empresa de minério de ferro, não de níquel,” disse uma fonte da área de produção. “O feijão-com-arroz da Inco era o níquel e as operações de Sudbury, e o sindicato sempre soube disto. Mas para os lucros da Vale, o níquel é apenas um detalhe.”
O sindicato da planta da Vale Inco em Sudbury tem um longo histórico de greves.
“A Vale está ganhando muito dinheiro e pode se dar ao luxo de fincar o pé. São circunstâncias totalmente diferentes [de lidar com a Inco],” disse um outro trader de níquel.
A seção local 6500 do sindicato United Steelworkers (USW), que representa os cerca de 3.000 grevistas de Sudbury, entende isto.
“A Inco é uma parte tão pequena das operações da Vale como um todo, e de sua participação de mercado, que ela pode aguentar uma greve por mais tempo,” disse Wayne Fraser, diretor do Distrito 6 do USW. “A questão não é dinheiro; a Vale nos disse que a greve está dando um prejuízo de 7 milhões de dólares ao dia. Seria uma soma bem expressiva para a maior parte das empresas mas, pelo jeito, para ela não é.”
Também dão espaço de manobra à Vale os níveis de seus estoques nos armazéns da LME, que na manhã desta 4ª feira atingiam 161.292 toneladas.
“A Vale pode continuar por mais tempo sem se preocupar com dificuldades de receita, e devido aos fortes estoques da LME, ela confia que poderá cumprir suas obrigações contratuais,” disse um analista. “Se a direção quiser ser dura, ela pode, pois há folga no sistema.”
Os dois principais pontos de desacordo entre a Vale e o sindicato são as propostas da empresa para os planos de pensão (a Vale quer passar seus funcionários para um plano de contribuição definida ao invés do plano de benefícios atual) e o amplamente discutido abono relacionado ao preço do níquel.
“No passado, os trabalhadores sempre ganhavam um abono por vendas de níquel acima de 3 dólares por libra,” disse a fonte da área de produção. “Agora, o preço médio do níquel subiu, mas os sindicatos querem o mesmo abono. É com isso que a Vale se preocupa. Vai custar muito caro para ela.”
Contudo, a falta de disposição da Vale de fazer concessões ao USW, tanto na questão do abono quanto na questão do plano de pensão de contribuição definida, pode ter menos a ver com sua posição financeira atual e mais com sua abordagem de longo prazo para com o sindicato.
“Acho que agora já passou o momento em que a Vale poderia retirar seu reconhecimento [decertify] do sindicato. Após um certo período, que eu acho que já se foi, a Vale Inco teoricamente poderia demitir os trabalhadores e tocar a planta com um quadro não-sindicalizado de funcionários. A porta agora está aberta para a Vale fazer as coisas de maneira completamente diferente,” disse o segundo trader.
Entretanto, Fraser rejeitou esta idéia. “Eles nunca vão decertify o sindicato. Estamos aqui pra ficar,” disse ele. “O níquel daqui pertence ao povo de Sudbury; não vamos entregá-lo de mão beijada.”
A fonte da área de produção tampouco pôs fé. “Eu não diria que se eu fosse a Vale eu estaria tentando quebrar os sindicatos, mas estaria negociando a partir de uma posição forte, não fraca,” disse ele.
O anúncio feito pela Vale na semana passada de que estava se preparando para retomar a operação de um forno de níquel na fábrica Copper Cliff em Sudbury usando trabalhadores não-sindicalizados parece ser mais um sinal de que a empresa não pretende rever sua posição na negociação.
“Essa retomada da Vale é uma cortina de fumaça, pois ela não tem sentido sem o fornecimento da matéria-prima [o minério],” disse o analista. “Indica que ela não quer mesmo chegar a um acordo, e vai inflamar ainda mais a situação.”
O USW entrou com uma reclamação judicial relativa à má fé, por parte da Vale, na negociação. Ele alega que a empresa adotou uma posição ilícita e intransigente com relação à greve. Mas é improvável que a Vale sequer se sente à mesa de negociação a não ser que o sindicato aceite certas precondições, o que até o agora ele se recusou a fazer.
“Eis aqui um sindicato que já deixou bem claro que está disposto a se reunir sem precondições, sem quaisquer posições pré-determinadas, mas a resposta [da Vale] foi ‘não’,” disse o advogado do USW Brian Shell, com relação à reclamação formalizada em 13 de janeiro junto à Comissão de Relações de Trabalho de Ontario, em Toronto.
A Vale não quis comentar a questão.
A única outra maneira de fazer a Vale voltar para a mesa de negociação seria uma rápida resolução para a greve em potencial nas operações de níquel da Xstrata Plc em Sudbury, de acordo com pessoas que participam deste mercado.
Membros da seção local 598 do sindicato Canadian Auto Workers (CAW), que representa os trabalhadores das operações de Sudbury da Xstrata, votaram maciçamente em favor de conceder à sua comissão de negociação um indicativo de greve e de abrir um fundo de greve local, tendo em vista o vencimento em 31 de janeiro de seu acordo coletivo trienal.
A despeito de tensões históricas entre o USW e o CAW, os dois sindicatos “estabeleceram um pacto de unidade para combater juntos as empresas que se juntaram para nos combater,” de acordo com a página do CAW na internet.
Ainda não está claro se as negociações na Xstrata resultarão numa greve. “Não é boa hora para se estar desempregado [por causa do inverno canadense rigoroso],” disse o segundo trader. “A chance de greve na Xstrata é de 50%.”
Porém, relatos de fontes do mercado dão conta de que a Xstrata está tentando aumentar os estoques de matéria-prima para sua usina de refino em Kristiansand na Noruega, enquanto reduz compras secundárias para Sudbury. Isto sugeriria que a empresa está se preparando ao menos para a possibilidade de uma greve no Canadá.
Conversações entre o CAW e a mineradora com sede em Zug, Suíça, começaram em 16 de dezembro, mas o sindicato disse que estas haviam “progredido lentamente” e que ele segue determinado a manter sua “posição negocial favorável”.
Um porta-voz da Xstrata disse que a empresa está comprometida com a meta de alcançar uma solução antes da data-limite de 31 de janeiro, sem perda de produção.
Se os trabalhadores do CAW realmente entrarem em greve, uma solução rápida poderia pressionar a Vale a oferecer condições semelhantes aos trabalhadores filiados ao USW, de acordo com as fontes. “Uma vez que uma empresa admite que pode pagar um certo nível salarial, isto pressiona as outras,” disse o segundo analista. “A Vale pode fazer jogo duro porque não existe um padrão que os sindicatos possam indicar.”
Mesmo assim, a Vale pode manter sua linha quanto aos planos de pensão e abonos. Enquanto a empresa não tiver apego à sua receita de Sudbury, ela poderá resistir. “O governo brasileiro ainda é dono de uma porcentagem do capital da Vale e se preocupa com empregos brasileiros, não com empregos canadenses,” disse a fonte da área de produção. “E a Vale tem como esperar mais tempo que os sindicatos.”
Fonte: AMERICAN METAL MARKET – Jethro Wookey | 20 de janeiro de 2010 | 16h45 | Tradução: Leandro Moura