Em uma tarde emocionante, a jovem moradora Gerliane da Silva Chaves, contou sobre a construção do capítulo “O Grito e a beleza de Piquiá de Cima a Baixo”. Falou de como os grandes empreendimentos se apropriaram das riquezas naturais do bairro, da troca de saberes com os mais velhos na luta, da organização, do sonho e das conquistas. O bate-papo fez parte do lançamento do livro “Liberdade caça jeito, a história de todos na história de cada um”, realizado na primeira semana de novembro de 2019, em São Luís/MA.
Lançamento do livro, em São Luís, contou com a participação das autoras e autores (Foto: Arquivo JnT)
O livro foi produzido por uma grande rede solidária de organizações como Justiça nos Trilhos, Grupo de Estudos e Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente (GEDMMA) da UFMA, com o apoio da Fundação Ford, da Development and Peace e da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA). A publicação, de acordo com o professor da UFMA, Horácio Antunes, representa o registro de memória de um processo educativo de formação política que formalmente durou três anos (2014 a 2017). “São relatos vigorosos, cheios de vida e de emoção, construídos a partir da experiência dolorosa dos enfrentamentos desiguais com grandes empreendimentos privados e estatais”.
No conteúdo, a luta enfrentada pelos povos e comunidades tradicionais, indígenas, quilombolas e camponeses. São quase 50 páginas dedicadas à comunidade de Piquiá, localizada no município de Açailândia/MA, construída coletivamente pela juventude. À frente dos trabalhos de pesquisa e da troca de saberes: Aline Araújo Pereira, Gerliane da Silva Chaves, Jefferson Yuri Lima, João Paulo da Silva e Marcos da Silva. Na abertura do capítulo, o comunicólogo Mikaell Carvalho conta a história de 25 anos de como os moradores, cansados do desrespeito dos grandes empreendimentos, organizaram-se para exigir das empresas um novo terreno digno para morar, longe de todas as mazelas.
No capítulo de Piquiá, a experiência de quem começou a luta. Na história do bairro resistente, do verde cheio de vida ao cinza do descaso dos governantes e dos grandes empreendimentos, depoimentos de quem testemunhou essa destruição e transformação. Entre eles, seu Joaquim, dona Tida, Dona Osmarina. O leitor encontrará ainda o Histórico do Bairro, a Chegada do projeto Grande Carajás, Da instalação das indústrias e as problemáticas, As contradições de desenvolvimento, O que dizem os moradores: Sobre as problemáticas causadas pela mineração e as indústrias, Resistência, Linha do Tempo, Vigilância Popular em Saúde e Prêmio Fapema – Desenvolvimento Humano, O que dizem os moradores sobre organização, sonhos e conquistas.
Entre as mulheres homenageadas no capítulo de “O Grito e a beleza de Piquiá de Cima a Baixo” estão dona Francisca Sousa, carinhosamente chamada de dona Tida e Flávia Nascimento. De acordo com a narrativa “elas são sementes, nasceram da raiz da luta e os frutos fizeram brotar”.
Dona Tida chegou em Piquiá na década de 70 e fez parte do processo de luta contra as siderúrgicas e o dragão de ferro desde o início. Atualmente foi eleita presidente da Associação Comunitária de Piquiá (ACMP) e sempre gostou de trabalhar coletivamente em prol da comunidade na igreja e nas causas sociais.
A jovem Flávia Nascimento, de 24 anos, nasceu, cresceu e mora no bairro. Ela integra o projeto de Vigilância Popular em Saúde, de acompanhamento das medições de poluição ambiental do ar e que foi premiado pela FAPEMA. Atualmente é fiscal da nova diretoria eleita da comunidade. Recentemente participou do Sínodo para a Amazônia no Vaticano, onde relatou a situação de Piquiá ao Papa Francisco. Ela também participou de evento na sede da ONU, em Genebra, Suíça, falando sobre a história de luta e resistência do bairro frente as agressões socioambientais causadas pelos empreendimentos de mineração.
Para a jovem Gerliane da Silva Chaves, que representou a comunidade no lançamento de “Liberdade caça jeito”, o momento foi único. “Saímos ainda mais fortalecidos desse processo, com a certeza de ter que continuar a levar a luta dos mais velhos pra frente, por nós, pelos nossos filhos. É importante afirmamos a nossa história, a nossa luta e resistência, pois, a ameaça de desconstrução é enorme”, disse.
por Yndara Vasques