Justiça nos Trilhos e Instituto PACS lançam livros sobre mulheres atingidas por megaprojetos em Açailândia-MA
19 de maio, 2022

Na tarde desta quinta-feira (19/05), foram lançados os livros “Mulheres Atingidas, territórios atravessados por megaprojetos” e “Teias de Luta: narrativas feministas em resistência aos megaprojetos”. O lançamento aconteceu no Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos Carmen Bascarán (CDVDH/CB), no Centro de Açailândia (MA) e contou com a parceria da Justiça nos Trilhos (JnT).

Açailândia é um dos municípios do Maranhão que é atravessado pelos grandes empreendimentos que giram em torno da mineração, além das monoculturas de soja e eucalipto. A cidade é cercada por empresas guseiras, fábricas de cimento e pela Vale, através da Estada de Ferro Carajás (EFC).

No lançamento estiveram presentes moradoras e moradores das comunidades atingidas por mega empreendimentos, como Piquiá de Baixo, e assentamentos da zona rural de Açailândia, pessoas que moram ao longo da EFC.

O evento também contou com a participação de professores universitários da região tocantina, que integram grupos de pesquisas da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Universidade do Norte do Tocantins (UFNT), Universidade Estadual da Região Tocantina do Maranhão (UEMASUL) Campus de Imperatriz e Açailândia, além de estudantes universitárias das respectivas universidades, movimentos sociais, entidades da sociedade civil, religiosos (as) e o Centro de Defesa que concedeu o espaço para o lançamento dos livros.

A produção dos livros é do Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (PACS), representado na ocasião por Ana Luísa Queiroz (PACS) e Yasmin Bitencourt (PACS). Larissa Santos, da Justiça nos Trilhos (JnT) também participou do lançamento, já que é uma das autoras do livro Teias de Luta.

Após o encerramento da mesa, o microfone ficou aberto para intervenções dos presentes, foram feitas perguntas e partilhas sobre o processo de produção dos livros. Além disso, foi feita uma distribuição gratuita dos livros e o sorteio de uma bolsa artesanal.

Ana Maria Farias Sousa, que representa as mulheres artesãs de Piquiá de Baixo, levou uma lembrança das artesãs para as três autoras presentes e foi uma das ganhadoras do sorteio de uma bolsa, ela participou das rodas de conversas e oficinas para produção dos livros.

“Quero agradecer por ter sido escolhida para falar um pouquinho do desenho que a gente fez em grupo em Piquiá de Baixo, desse grupo eu fui a primeira a receber o livro que mostra um pouco da nossa história e conquistas. Fico muito feliz porque outras pessoas através do livro vão ver e conhecer a nossa história, as lembrancinhas que eu entreguei é uma forma de agradecimento a essas pessoas que ajudaram a divulgar o que a gente vive aqui. Ganhei uma bolsa linda no sorteio, para mim foi uma troca muito bonita, fiquei muito feliz de ter participado de mais um encontro maravilhoso”. Concluiu Ana Maria, moradora de Piquiá de Baixo.

A educadora popular Kelly Barbosa, que esteve recentemente em caravana pela Europa denunciando as violações aos direitos humanos e da natureza que se relacionam diretamente com esses megaprojetos afirmou que o livro é uma conquista: “Saber que nossa história está sendo eternizada nesse livro é uma conquista muito grande. Servir de exemplo para mulheres desta e de outras gerações é o mais importante em todas essas memórias que são eternizadas nesses livros.”

Processos de formação popular e escuta com rodas de mulheres
Os livros lançados nesta quinta-feira, (19/05), trazem experiências vividas por mulheres ao longo da EFC, trazem os impactos socioambientais, humanos, econômicos e culturais vividos principalmente pelas mulheres.

“Eu acho que os livros que a gente tá divulgando trazem essas experiências que a JnT realiza e tem realizado nos últimos anos ao longo do Corredor Carajás com as mulheres atingidas pela mineração. É um processo de reconhecimento dos nossos direitos. Eu também me reconheci como mulher maranhense e mulher negra afetada pela Vale e pelo agronegócio”, pontuou Larissa Santos.

Outro ponto comentado por Larissa Santos é o impacto da mineração na vida das mulheres. “No livro discorremos sobre o impacto no dia a dia do cuidar da mulher, responsável por cuidar do homem que adoece, pela casa que recebe o pó diário das siderúrgicas. Do Igarapé cimentado pela Vale no quilombo Santa Rosa dos Pretos. De como esses impactos são sentidos sobre os corpos das mulheres, como podemos discutir esses impactos e dar eco a essas narrativas.”

Ana Luisa, do Instituto Pacs, conta que o trabalho de elaboração dos livros consistiu no entendimento sobre o que são os megaprojetos: “Nosso trabalho tem atuado no entendimento desses megaprojetos e empresas, pesquisas para entender e está próximo dos territórios denunciando essas violações de direitos humanos. Trabalhamos também com alternativas a esses projetos em defesa da vida. Com crítica ao modelo de desenvolvimento capitalista, racista e LGBTfóbico.”

O levantamento e mapeamento foi feito em 5 estados brasileiros, entre eles o Maranhão.
“Levantamos e mapeamos que tipo de impacto chega diretamente para as mulheres. Será que elas são impactadas da mesma maneira que os homens na mesma casa? Aconteceu no Rio de Janeiro, Pará, Maranhão, Pernambuco e Minas Gerais. Mapeamentos coletivos, rodas de conversa e oficinas. Todos esses territórios têm histórias e verdades para contar e serem ditas”, concluiu Ana Luisa.


“Feminismos nossos: o corpo que luta, precisa de saúde para lutar.”
Como foi falar desses megaprojetos a partir do corpo feminino?

A Campanha Mulheres Territórios de Luta foi um processo de mais de três anos com mulheres de coletivos e comunidades atingidas pela mineração.
“Os feminismos que a gente constrói inclui todas as lutas, a diversidade que nós estamos inseridas. A gente vive uma conjuntura muito dura. A gente vive em um governo de perseguição e criminalização da organização social. A gente tenta construir um feminismo que envolva mulheres não brancas, mulheres racializadas, que veja os homens também como possíveis aliados.”

Os livros foram construídos no mesmo lugar de pesquisa, mas com propostas diferentes, é o que aponta Yasmin Bittencourt do PACS:
“Os livros vêm desse mesmo lugar de pesquisa, mas com propostas diferentes. A gente sabe da importância da documentação mais acadêmica dessas violações nos territórios, que é as mulheres atingidas, que vai falar de siderúrgicas em Belo Monte, da Estrada de Ferro Carajás, do Rio de Janeiro de uma forma mais acadêmica. Só que nesse processo queríamos que houvesse outro resultado, queríamos tentar trazer esses temas e conteúdo de outra forma, um material que fosse escrito em conjunto, inspirado na educação popular. Um material que coubesse um pouco de cada uma dessas mulheres”, destacou Yasmin Bittencourt.

Teias de Luta é um livro mais poético em que segundo Yasmin Bittencourt o objetivo era trazer a dimensão das potências, do poder das mulheres, a própria dimensão do prazer da vida, a construção da luta dessas mulheres e seus afetos, amores.

Conheça as autoras que estavam no lançamento
Ana Luisa Queiroz é feminista interseccional, educadora popular, neta de Graça e de Marlinda. Mestra em Sociologia e Antropologia pela UFRJ, compõe a equipe do Instituto Pacs como coordenadora de projetos e pesquisadora.

Larissa Santos é coordenadora política na Justiça nos Trilhos. Jornalista (UFMA) e mestra em Ciências da Comunicação (UFPA). Entende e defende a comunicação com um direito humano e a articulação coletiva como o caminho para a transformação social.

Yasmin Bitencourt é graduada em Relações Internacionais na UFRRJ, feminista, pesquisadora e educadora popular. Constrói sua atuação política e profissional desde práticas feministas, latino-americanas, anticapitalistas e antirracistas.

Por José Carlos Almeida com a colaboração de Yanna Duarte.