Entidades defendem criação de fundo pós-extrativista | Justiça nos Trilhos
10 de julho, 2012

Entidades e sindicatos debateram em audiência pública na Câmara a proposta de Fundos Sociais Comunitários da mineração. O tema foi aprofundado em seguida, ao longo de dois dias de seminário, e continuará sendo debatido para interagir na reforma do Código de Mineração. A proposta dos fundos visa amenizar os impactos gerados pelas minas já existentes. Os movimentos sociais reivindicam, na mesma reforma, garantia de consulta prévia às populações, para que tenham o direito também de dizer não a novos empreendimentos de mineração.

Movimentos sociais ligados aos direitos humanos e à defesa do meio ambiente, além de sindicalistas e representantes de movimentos comunitários, defenderam nesta quinta-feira a criação de fundos sociais para reparar os danos causados às comunidades pela atividade de mineração. A proposta de criação de fundos foi discutida em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Minorias.

A ideia é que esses fundos, geridos por conselhos comunitários, recebam parte das rendas obtidas com a mineração e apliquem esses recursos não apenas na reparação de danos provocados pela atividade como na promoção do desenvolvimento sustentável nos municípios mineradores. Para o secretário de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do Ministério de Minas e Energia, Cláudio Scliar, a ideia do fundo é “interessante” e deverá ser debatida pelo Congresso.

Segundo o professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) Rodrigo Salles Santos, a proposta é que o Estado crie um novo fundo, além dos royalties. “Os fundos, diferentemente dos royalties, beneficiariam diretamente as populações afetadas”, explicou. “Eles devem servir para diversificar a economia local”, complementou. Santos realizou estudo sobre a criação dos fundos para o Observatório do Pré-Sal e da Indústria Extrativa Mineral, com apoio de outras organizações não governamentais.

De acordo com o professor, deveriam ser beneficiárias desse fundo social todas as comunidades afetadas pela rede produtiva da atividade mineral, que engloba desde a extração à exportação, passando pelo processamento.

Desigualdades sociais
O presidente da comissão, deputado Domingos Dutra (PT-MA), que propôs o debate, disse que é preciso que haja uma repartição da riqueza mineral produzida no Brasil, de forma a diminuir as desigualdades sociais no País. Dutra cita como exemplo o corredor Carajás, que corta 23 municípios no Maranhão e 4 no Pará, por onde são transportadas cerca de 465 milhões de toneladas de minério de ferro para embarque no terminal ferroviário de Carajás, no município de Parauapebas (PA). “Os péssimos indicadores sociais dessa região atestam o desequilíbrio entre os benefícios e os danos da atividade”, diz o deputado.

Dutra criticou a ausência da empresa mineradora Vale do Rio Doce, que foi convidada para participar da audiência e não compareceu. 

O secretário de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do Ministério de Minas e Energia, Cláudio Scliar, afirmou que os indicadores sociais ruins de alguns estados não são fruto apenas da atividade de mineração. “A mineração compõe 3,8% do Produto Interno Bruto brasileiro”, disse. “O Brasil não é um país mineiro; a mineração é importante apenas para alguns estados”, completou.

Na visão de Scliar, um dos problemas do setor mineral hoje é a baixa participação governamental na renda mineral. “Os nossos royalties são muito baixos”, afirmou. Ele também atesta a inexistência de mecanismos que possibilitem políticas de interesse nacional e a fragilidade institucional do órgão regulador do setor, além da utilização de direitos minerários em práticas anticompetitivas, entre outros problemas. Para o representante do ministério, esse quadro é fruto da desatualização do atual Código de Mineração, que é de 1967.

Novo código
Segundo Scliar, a prioridade do ministério é a elaboração do novo código. Entre outros pontos, esse código deverá criar o conselho nacional de política mineral e vai prever contrato de concessão para a atividade, com prazo definido. Além disso, o objetivo é que as empresas façam pagamento ao Estado por ocupação ou retenção de área – ou seja, pagamento também durante a exploração, e não apenas na fase de pesquisa, como é hoje. Pela proposta, será criada ainda a Agência Nacional de Mineração, que vai monitorar, fiscalizar e regular as cadeias produtivas de base mineral.

O representante do Sindicato Metabase de Congonhas (MG), Valério Vieira, acredita que a criação de uma agência reguladora não resolverá os problemas do setor. “A Vale do Rio Doce não paga impostos e não respeita as normas de segurança para os trabalhadores e nem as comunidades”, afirmou. Conforme o sindicalista, 13 trabalhadores já morreram em acidentes dentro da Vale do Rio Doce só este ano. No ano passado, foram 15 acidentes fatais dentro da empresa. Ele destacou ainda os altos impactos ambientais e na saúde das comunidades causados pela atividade de mineração.

Guilherme Zagalo, que representou na audiência a rede social Justiça nos Trilhos , disse que falta ao governo agregar à sua proposta o ponto de vista das comunidades afetadas pela mineração. A intenção da rede social é de que a proposta de fundos sociais seja agregada ao anteprojeto de novo código de mineração. Caso isso não ocorra, a proposta será levada separadamente ao Congresso, na forma de projeto de lei proposto por algum deputado. 

Ele destacou ainda que a visão da organização é de que o setor é pouco tributado. “Não são só os royalties que estão baixos, mas também a carga tributária”, destacou. Ele ressaltou ainda que, no atual modelo do setor, não há previsão de nenhum tipo de reparação dos danos para as comunidades por parte das empresas exploradoras da atividade.

Fonte: Agência Câmara de notícias, 03.05.12