A Responsabilidade Civil de uma Estrada de Ferro | Justiça nos Trilhos
1 de dezembro, 2011

Seminário em Buriticupu com a assessoria do juiz Douglas de Melo Martins

Buriticupu é um dos centros urbanos em que mais fortemente aparece o contraste: uma grande riqueza atravessa o território do município ao longo dos trilhos da ferrovia, mas a população encontra-se em situações de extremo degrado, violência, injustiça. A campanha Justiça nos Trilhos realiza seu primeiro seminário de conscientização popular no centro de Buriticupu: no dia 28 de junho, apesar das convenções partidárias rumo às eleições, muitas associações e grupos se reunem para um estudo sobre a Vale do Rio Doce e sua ferrovia. Estão presentes a Paróquia da Terra Bela, a Pastoral da Criança, o Sindicato dos Trabalhadores de Agricultura Familiar, o CEFET, a Associação dos Comerciantes, vários professores, a Caritas, o Conselho Tutelar, o Najup (Núcleo de Assessoria Jurídica Popular) de São Luis, a Promotoria Pública na pessoa da dr. Teresa (Codó), os Missionários Combonianos de Açailândia, as irmãs oblatas de Buriticupu, outros cidadãos e cidadãs de Bom Jesus das Selvas, Novo Bacabal, Pequiá e Açailândia. O tema aparece interessante: “A responsabilidade civil de uma ferrovia”. O relator é muito animado e competente: o juiz Douglas de Melo Martins, da comarca de Pedreiras, famoso por algumas sentenças corajosas, entre as quais uma contra a Vale. O seminário começa com uma fundamentação jurídica: o decreto 2681, do ano 1912, é o primeiro registro legal no Brasil sobre a “responsabilidade objetiva”. Trata-se da responsabilidade que não depende de culpa e que é presumida sempre, simplesmente pelo fato de existirem empreendimentos ou estruturas potencialmente perigosas.

O artigo 17 do referido decreto reza que “as estradas de ferro responderão pelos desastres que acontecerem ao longo delas”. A culpa é presumida, não precisa demonstrar que de alguma forma a estrada de ferro concorreu no dano: a indenização é obrigatória.

A segunda fundamentação jurídica vem diretamente da Constituição Federal (artigo 5, inciso 23): a função social da propriedade. Em outras palavras, também os papas Leão XIII e João XXIII disseram a mesma coisa: o que temos é para o proveito da comunidade. A propriedade privada não é um direito incondicional e absoluto: não é legítima uma propriedade privada sem uma função social, sobretudo no contexto de nossas regiões, onde aos demais falta o necessário para viver dignamente.

A partir desses pressupostos, o juiz começa uma reflexão muito animada e participada sobre o dever da Vale para com a população ao longo dos trilhos. 
A Vale está cumprindo com a sua função social? Que retorno oferece para a população?
Existe uma base jurídica consistente para pleitear nossos direitos em relação à Vale; a campanha Justiça nos Trilhos tem plena fundamentação jurídica.
A partir de um levantamento recente, o juiz Douglas deu-se conta do grande número de ações e processos de pessoas que sofreram lesões diretas pela Vale. No site www.justicanostrilhos.orgestá disponível o elenco parcial dessas ações (ainda não conseguimos alcançar os dados das comarcas não informatizadas; mesmo assim, o número de processos é já assustador).
Infelizmente, o gigante Vale não se preocupa nem um pouco dessas indenizações; muitas vezes os processos e os pagamentos atrasam bastante. É necessária e urgente a pressão social sobre a Vale, sobre a magistratura e as autoridades todas, para que os objetivos de Justiça nos Trilhos (epsecialmente as indenizações e compensações) sejam alcançados de forma consistente.