Seminário debate Pedagogia da Alternância
31 de agosto, 2018

O seminário foi realizado no município de Imperatriz (MA).

Quais são as políticas públicas voltadas para a Educação do Campo existentes no Maranhão? Como as Casas Familiares Rurais (CFRs) funcionam e qual o papel delas na formação dos jovens camponeses? É possível aproximar Pedagogia da Alternância (modalidade de Educação do Campo) e Universidade? Estes foram alguns dos temas abordados no II Seminário Tocantino da Pedagogia da Alternância, que ocorreu na última quinta-feira, 12 de abril, no auditório da Universidade Estadual do Sul do Maranhão (Uemasul), em Imperatriz (MA).

O evento, que foi organizado pela Associação Tocantina de Formação por Alternância e Desenvolvimento Rural (ATAR), pela Justiça nos Trilhos e pelas quatro Casas Familiares Rurais (CFRs) da região, reuniu educadores do campo, estudantes das CFRs, famílias e professores universitários.

A mesa de abertura do Seminário tratou sobre a Educação do Campo no Brasil e no Estado do Maranhão, enfocando dois tipos de metodologias presentes na Região Tocantina: a Pedagogia da Terra, representada principalmente pelas práticas do Movimento Sem Terra (MST) e a Pedagogia da Alternância, utilizada nas CFRs.

O Seminário reuniu estudantes das CFRs, famílias, educadores e professores universitário (Foto: Idayane Ferreira)

“Educação do Campo: direito nosso, dever do Estado”

A Educação do Campo surgiu em contraposição ao conceito de educação rural e propõe não apenas a alfabetização da população camponesa, mas uma formação que seja condizente com a sua realidade, permitindo sua permanência qualificada no campo. As políticas públicas voltadas para este tipo de Educação são resultado de um longo processo de luta dos camponeses.

No Maranhão, o diálogo sobre o Programa Nacional de Educação nas Áreas de Reforma Agrária (Pronera) realizado entre a Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e o MST possibilitou as primeiras ações de alfabetização e escolarização de jovens e adultos, em 1998.

Francisco do Livramento Andrade, assessor pedagógico da CFR de Açailândia, explica quais são as políticas públicas voltada para a Educação do Campo existentes atualmente. “Hoje, nós temos mais concretamente do ponto de vista institucional duas políticas de formação: uma política que é o Pronera abrange várias áreas. E o Procampo [Programa de Apoio à Formação Superior em Educação do Campo] que é mais para a formação de professores”.

Ele aponta que um dos maiores desafios nesses 20 anos de consolidação da Educação do Campo ainda é o acesso às políticas públicas “principalmente nesse momento que nós estamos vivendo, de um governo de desmonte das conquistas. Outro desafio é a formação do nosso povo, nós precisamos da formação de muitos profissionais e isso também perpassa o acesso aos recursos, aos editais das políticas públicas. Precisamos formar a nossa base, gente que está diretamente no campo para que assim possamos construir no campo um espaço de produção de alimentos, de produção de vidas, de produção de saberes”, afirma.

“A terra é para quem estuda também”: CFRs e a Pedagogia da Alternância

Houve um tempo em que “ir pra roça” era uma forma de ameaça às crianças que se interessavam pouco pelos estudos e um ponto de vista retrógrado em relação ao campo. As Casas Familiares Rurais demonstram na prática que a Educação do Campo contribui para o desenvolvimento rural, para a produção agrícola mais qualificada e consequentemente traz benefícios para o meio urbano também, uma vez que a agricultura familiar é responsável pela maior parte da produção de alimentos em nosso país.

Jovens relatam suas experiências com projetos nas CRFs (Foto: Idayane Ferreira)

As Casas Familiares Rurais estão presentes em cinco dos seis continentes e o Brasil é o segundo país em número, com 252 CFRs, 19 destas ficam localizadas no Maranhão. A CFR mais antiga do Estado é a de Coquelândia, que fica no município de Imperatriz e que atualmente atende cerca de 50 estudantes.

Na metodologia utilizada nas CFRs, os estudantes alternam períodos de estudo como internos da escola com períodos de formação com a família. Diferentemente de uma escola comum, as áreas de conhecimento são destrinchadas a partir de temas geradores, partindo-se da prática para a teoria. Tem por finalidade a “formação integral do ser humano e o desenvolvimento dos meios locais”.

A CFR é comunitária, gestada por uma associação de agricultores. Ela funciona por meio de parcerias com o poder público municipal ou estadual, que deveriam garantir a manutenção de equipes pedagógicas (monitores) em tempo integral e de dedicação exclusiva. Atualmente as CFRs têm enfrentado entre outros desafios a falta de financiamento e quando este acontece, há dificuldade para manter sua autonomia política administrativa.

“A dúvida é o princípio da pesquisa”: proximidades entre a Pedagogia da Alternância e a Universidade

Entre os instrumentos pedagógicos utilizados nas CFRs está o chamado projeto profissional ou de vida, quando os jovens devem planejar e executar um plano de intervenção ou empreendimento nas terras de suas famílias. Os que estiveram presentes no Seminário puderam conhecer as experiências de quatro desses jovens.

O mais novo deles, de apenas 17 anos, está realizando o processo de reflorestamento de uma nascente, localizada na propriedade da família. “Ainda estou no início, mas espero que a nascente seja recuperada”, afirmou Antônio, da Casa Familiar Rural Padre Josimo, que atende os municípios de Bom Jardim, Bom Jesus das Selvas e Buriticupu.
Agenor é ex-aluno da primeira turma da CFR Margarida Alves, de Amarante. “Eu queria criar galinhas, mas não tinha dinheiro, então iniciei plantando hortaliças, pois as sementes eram mais baratas. As pessoas ficavam impressionadas com o tamanho das folhas das couves orgânicas [gigantes]. Vendi as hortaliças e apurei 600 reais que foi com o que eu comecei a criação de galinhas”. Na falta de um aquecedor para os pintinhos, o jovem improvisou construindo uma espécie de forno a lenha. Tanta inventividade tornou seu projeto conhecido até fora do país.

A mesa redonda de finalização do Seminário propôs maior proximidade entre a Universidade e a Pedagogia da Alternância (Foto: Idayane Ferreira)

Francisco e Patrick descreveram respectivamente as experiências com a apicultura e com a criação de gado leiteiro. Os empreendimentos dos quatro jovens foram bem distintos, mas em comum eles relatam que tiveram de vencer a desconfiança inicial dos pais e das pessoas mais velhas. “Eu ouvi demais que só gente doida criava abelhas”, riu Francisco.

Após a apresentação dos jovens houve uma mesa redonda sobre as possibilidades de aproximação entre a Universidade e a Pedagogia da Alternância com a participação dos professores Dr. Francisco de Assis Carvalho de Almada (Uemasul e UFMA) e Dra. Betânia Oliveira Barroso (UFMA).

Além de relatarem um pouco das suas experiências com relação à Educação do Campo, os professores apontaram alguns caminhos possíveis para uma interação entre a Universidade e a Pedagogia da Alternância como a realização de projetos de pesquisa e extensão, de convênios entre as instituições para uma relação prática-teórica, estágios supervisionados, entre outros. O Seminário trouxe só as primeiras inquietações: É possível sim uma aproximação e o primeiro passo já foi dado!

Por Idayane Ferreira