“Este encontro de celebração da existência dos 25 anos da Rama, é momento de afirmação da necessidade urgente de incidirmos em estratégias e proposições de legislações e mecanismos para banimento de agrotóxicos, bem como das mudanças de legislações que venham invadir territórios, vender as florestas, sem que haja uma mínima Consulta Livre Prévia, Informada e de Boa Fé aos Povos e Comunidades Tradicionais”, diz parte da carta.
A Rede de Agroecologia do Maranhão– Rama, nos dias 23 a 25 de agosto de 2023, reunidos debaixo da sombra das mangueiras e ao som das cigarras, iniciamos o V Encontro Maranhense de Agroecologia, com o tema, RAMA: 25 anos em Defesa da Vida, Contra os Agrotóxicos.
O encontro celebra os 25 anos de atuação da Rede de Agroecologia do Maranhão, e sua realização é uma parceria junto a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida e suas organizações filiadas.
Somos mais de 100 representantes de diversas organizações e movimentos populares do estado, grupos de estudos, parceiros, aliados e amigos que ao longo dos dias pudemos ouvir como cada um tem atuado com a agroecologia para promoção da soberania alimentar e nas defesas dos territórios livres. Também foi um momento de fazer memória da fundação da RAMA e as principais ações protagonizadas ao longo desses anos.
A agroecologia no Maranhão une diversidades de povos que reafirmaram suas resistências para com defesa dos modos de vida, contra o agronegócio que explora e consome vidas, a terra, ar, água, animais, tudo em prol da acumulação e com a lógica de insumos. Nesse contexto os AGROTÓXICOS têm sido usado como uma arma química, dentro da estratégia de guerra contra os corpos-territórios, sobretudo das mulheres. Nos territórios quilombolas de Cocalinho e Guerreiro, no município de Parnarama foram identificados nove princípios ativos diferentes nas águas destas comunidades, sendo que um deles, a Atrazina, identificada duas vezes acima do limite permitido pelas normativas brasileiras.
Nossos corpos e territórios, não devem ser zonas de sacrifícios, ao contrário, somos e temos corpos sagrados. O Maranhão tem uma epidemia de pessoas ameaçadas, hoje são mais de 400 corpos que correm risco de terem suas histórias paralisadas pela ganância do agronegócio.
O Maranhão abriga os biomas Cerrado e Amazônia, e todos os dias, os/as que sofrem violações dos direitos humanos, ameaças de mortes, destruição de babaçuais e outras florestas, queima de casas, roubo de águas dos rios-riachos, os campos naturais da Baixada Maranhense, roubo promovidos pela rizicultura e piscicultura do agronegócio, apagamento da biodiversidade e a interrupção dos conhecimentos tradicionais dos povos desses territórios. É inadmissível e violenta a ausência do estado do Maranhão na resolução desses conflitos. O Estado não pode privilegiar algumas vidas em detrimento do sacrifício de outras.
Este encontro de celebração da existência dos 25 anos da Rama, é momento de afirmação da necessidade urgente de incidirmos em estratégias e proposições de legislações e mecanismos para banimento de agrotóxicos, bem como das mudanças de legislações que venham invadir territórios, vender as florestas, sem que haja uma mínima Consulta Livre Prévia, Informada e de Boa Fé aos Povos e Comunidades Tradicionais.
Nesse sentido expressamos, exigimos e reafirmamos:
Apoio aos povos indígenas na luta contra a financeirização dos seus territórios e os riscos a desterritorialização trazidas pela economia verde e bioeconomia, a exemplo do povo Ka’apor Tuxa Ta Pame do Território indígena Alto Turiaçu, região noroeste do Maranhão.
Repudiamos a tentativa da bancada ruralista na aprovação do Marco Temporal que tem avançado sua tramitação no Congresso Nacional, reivindicamos que Parlamentares e Ministros/as do Supremo Tribunal Federal não permitam que mais essa violência aconteça contra os povos indígenas. Não ao Marco Temporal!
A RAMA e todo movimento agroecológico nacional é contra a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito orquestrada pela bancada ruralista para criminalização dos trabalhadores/as do Movimento dos Sem Terra. O MST é uma importante expressão da agroecologia mundial, produzindo comida de verdade e promovendo solidariedade para todos que tem fome. Toda a farsa que essa CPMI representa é um atentado a todos movimentos sociais brasileiros, principalmente aos que lutam pelo direito de terra e território e toda produção de alimentos saudáveis que fazem parte desses lugares. Somos todos/as MST.
No V EMA a RAMA lança uma importante e potente campanha contra os agrotóxicos que tem sido usado como arma química, tendo na centralidade dessa ação a proposição do projeto de Lei de Iniciativa Popular. Agrotóxico Mata!
Repudiamos todas as formas de violência que as mulheres tem sofrido em seus corpos-territórios causados pelo agronegócio. Exigimos medidas concretas de proteção, cuidados, demarcação e regularização dos territórios para essas que são as guardiãs dos saberes ancestrais e da agroecologia. Sem Mulheres não há Agroecologia!
Exigimos que a Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica (Peapoma) seja regulamentada para que haja a participação dos povos e comunidades tradicionais, agricultores/as familiares, assentados/as da reforma agrária na gestão da política. Viabilizar o funcionamento dessa importante política com recursos necessários para implementação das ações que permitam o fortalecimento das experiências agroecológica em todo Maranhão é de suma importância para as populações do campo e da cidade.
Atualmente com a realidade das mudanças climáticas provocadas pelos processos capitalistas, governos e empresas tem apresentado mecanismos de financeirização da natureza que ameaçam direitos aos territórios e aos bens comuns, expressados pelos contratos e projetos de créditos de carbono, Redd+ e bioeconomia. Essa nova face do capitalismo “encapado” de verde trás falsas soluções aos problemas que foram causados pelos modelos econômicos que defendidos pelas mesmas empresas e governos. Repudiamos as inciativas do Governo do Estado do Maranhão de implementar ações que colocam em risco os bens comuns de serem apropriados por empresas e governos que defendem direitos estrangeiros e colocam em xeque a soberania nacional e toda a riqueza dos territórios.
Repudiamos veemente o desrespeito do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar para com as 51 organizações do Maranhão que assinaram a carta compromisso do movimento agroecológico maranhense que indicou para a composição da superintendência regional da Conab do Maranhão. O MDA/CONAB, ao contrário, atendeu a indicação de Francisco José Cysne Aderaldo pelo seu aliado político Deputado Federal Júnior Marreca, reconhecido bolsonarista que foi vice líder da bancada do governo Bolsonaro e ainda instaurou um processo covarde de retaliação, assédio e criminalização do quadro indicação pelas organizações, ato vil realizado exatamente no dia em que a RAMA postou mensagem em defesa daquele nome indicado para gestor da CONAB/MA.
Denunciamos a ação violenta de envenenamento dos roçados da comunidade em Santa Rita, Peritoró, atingindo os corpos dos/as agricultores/as ocasionando problemas de saúde e de perda na produção da mandioca, feijão, milho, colocando as pessoas em estado de insegurança alimentar as famílias que também afeta a saúde de adultos e crianças nessa comunidade.
Repudiamos e denunciamos os latifundiários que fazem uso da técnica do “correntão”, que destrói a vegetação e ameaça os animais comprometendo toda biodiversidade e contribuindo com aumento dos efeitos das mudanças do clima. Essa ação frequentemente praticada para plantio de monocultivo, em especial a soja e eucalipto, em todo o Maranhão, já que no Estado, mesmo sendo uma prática proibida em todo país desde 2020, pela Lei nº 5.268 que incluiu no Código Florestal a proibição dessa prática, a falta de fiscalização e a certeza da impunidade impulsiona o uso dessa técnica medieval. Além disso, o aumento da especulação imobiliária nas diversas regiões do Cerrado e Amazônia impulsiona a prática da grilagem, e, com ela, a intimidação das comunidades tradicionais, sendo o correntão uma prática violenta que ajuda a concretizar a grilagem. O resultado é um processo de concentração fundiária nas mãos de grandes empresários do agronegócio, a maioria do Sul/Suldeste do país, e a expulsão de agricultores/as familiares e populações quilombolas, que vivem de cultivos de base familiar e do extrativismo vegetal. do cerrado
Denunciamos o envenenamento e derrubadas das palmeiras de coco babaçu pelos latifundiários, práticas essas feitas por pulverização área de agrotóxicos na aplicação de agrotóxico no estipe das palmeiras e nas derrubadas pelos tratores e correntões.
Denunciamos e repudiamos as ações da Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Maranhão, pela inoperância nas fiscalizações dos crimes ambientais, pela liberação das licenças ambientais dadas para destruição do Cerrado e da Amazônia, sem que haja nenhum processo de consulta livre, prévia, informada e de boa fé aos povos e comunidades tradicionais que vivem nos territórios.
Denunciamos a empresa ENEVA, que tem adentrado nas comunidades sem nenhum processo de consulta livre, prévia, informada e de boa fé, fazendo prospecções, e com perceptivas de perfurações de mais poços na região do Médio Mearim. Além disso, exigimos do governo federal a anulação de todo EDITAL PARA A QUALIFICAÇÃO DE PROJETOS DO POÇO
TRANSPARENTE lançado pela Agência Nacional de Petróleo e Gás no dia 07/12/2022, que trata sobre a exploração de FRACKING, que tem como estados prioritários o Maranhão e o Amazonas”.
A RAMA se compromete:
Fortalecer a articulação política junto aos movimentos em defesa dos territórios contra os agrotóxicos, reabrindo o canal de denúncia articulado junto ao Observatório Popular de Políticas de Sociobiodiversidade e Clima do Maranhão.
Realização de um seminário maranhense para exercitar diálogos e construir convergências possíveis sobre a economia verde e bioeconomia no Maranhão.
Promover através do Grupo de Trabalho de Mulheres da RAMA e Grupo de Trabalho de Diversidade Cuidado e Autocuidado do Observatório Popular de Políticas de Sociobiodiversidade e Clima do Maranhão, processo de autocuidado para as mulheres em situação de violência causadas pelas expressões do agronegócio.
Apresentar e articular as organizações do Estado do Maranhão para coleta de assinaturas de apoio à Lei Estadual de Iniciativa Popular contra os agrotóxicos.
Promover cirandas agroecológicas para as crianças como forma de construir a agroecologia para as próximas gerações.
O Movimento Agroecológico Maranhense se compromete em promover incidências para garantir o direito a terra e território a povos, comunidades tradicionais, acampados da reforma agrária e agricultores/as familiares.
Promover mais espaços de troca e interação entre as experiências agroecológicas dos territórios indígenas e quilombolas do Estado do Maranhão.
Quilombo São Bento do Juvenal, de agosto de 2023.
Fotos: Ingrid Barros