Mineradora Vale perde ação que movia na Justiça contra o Cimi
14 de julho, 2023

A decisão favorável ao Cimi Regional Maranhão foi publicada em sentença expedida na segunda-feira (10)

A juíza Kátia Coelho de Sousa Dias, titular da 1ª Vara Cível do Maranhão, indeferiu, na última segunda-feira (10), o pedido de liminar impetrado pela mineradora Vale S/A contra o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional Maranhão e as missionárias e professoras Madalena Borges e Rosana Diniz, em razão da ocupação da Estrada de Ferro Carajás (EFC) pelos indígenas Awá Guajá, da Terra Indígena (TI) Caru, em 2016.

Estrada de Ferro Carajás (EFC) – TI Awá Guajá. Foto: Rosana Diniz/Cimi Regional Maranhão

Na decisão, a magistrada destaca que não ficou comprovado que as missionárias agiram de forma a prejudicar o diálogo entre as partes conflitantes, os Awá e a mineradora. “Assim, não há outra medida jurisdicional que não o indeferimento. Ressalta-se que o pedido é baseado unicamente na suspensão de interdições na Estrada de Ferro Carajás, fato este que não mais subsiste”, acrescenta a juíza em sua sentença.

Para Madalena Borges, “ficou evidente o modus operandi da Vale ao mover ação de interdito contra nós, ou seja, tentou deslegitimar o movimento de indignação dos Awá diante do não cumprimento do acordo da empresa com a comunidade em função da duplicação da EFC”, afirma.

“Ficou evidente o modus operandi da Vale ao mover ação de interdito contra nós, ou seja, tentou deslegitimar o movimento de indignação dos Awá”

Povo Awá Guajá, da Terra Indígena Caru, no Maranhão. Foto: Madalena Borges/Cimi Regional Maranhão

“O movimento dos Awá na ferrovia foi legítimo, pois os Awa têm autonomia e capacidade de realizar manifestações em favor de seus direitos. A empresa Vale tentou criminalizar nossa atuação junto aos Awá, onde atuamos por muitos anos como professoras nas comunidades Awá e Tiracambu. Ao mover essa ação de interdito contra o Cimi e nós, professoras, a empresa tentou atribuir ao Cimi a responsabilidade pela interdição da EFC, ou seja, tentou uma prevenção judicial para que o Cimi se afaste de sua atuação junto aos Awa”, explica Rosana Diniz.

“A empresa Vale tentou criminalizar nossa atuação junto aos Awá, onde atuamos por muitos anos como professoras nas comunidades Awá e Tiracambu”

A missionária Rosana Diniz em dinâmica no território Awá, no Maranhão. Foto: Madalena Borges/Cimi Regional Maranhão

“O Cimi age com respaldo legal e a anuência dos indígenas em defesa da vida e dos diretos humanos. A empresa tentou criminalizar nossa presença junto a esse povo, mas os Awá nos apoiaram durante o processo e aprovam a nossa atuação nessa comunidade”, destaca Rosana Diniz.

Segundo Rafael Modesto, advogado e assessor jurídico do Cimi, a ação, proposta pela mineradora, inicialmente referia-se apenas à atividade de fechamento da ferrovia pelo povo Awá Guajá. “Então, logo se vê que o Cimi e as missionárias nada tinham a ver com a manifestação dos indígenas, que reivindicavam seus direitos”, enfatiza.

Ainda de acordo com o advogado, as missionárias realizavam trabalho de educação na comunidade e, quando chegaram no território, a ferrovia já estava fechada. “A Vale tentou jogar a responsabilidade para a entidade e para as missionárias, Rosana Diniz e Madalena Borges, mas a juíza julgou improcedente os pedidos de indenização, multa e interdito proibitório”, aponta.

“Foi uma clara tentativa de cercear o direito das missionárias e do Cimi de poder trabalhar com o povo Awá Guajá. Uma importante vitória para a instituição e para as missionárias contra a empresa Vale”, ressalta Modesto.

“Foi uma clara tentativa de cercear o direito das missionárias e do Cimi de poder trabalhar com o povo Awá Guajá”

Povo Awá Guajá, da Terra Indígena Caru, assiste aula da professora e missionária Madalena Borges, do Cimi Regional Maranhão. Foto: Rosana Diniz/Cimi Regional Maranhão

Entenda o caso

O povo Awá Guajá ocupou, em 2016, um trecho da ferrovia EFC que fica próximo à aldeia Awá, na Terra Indígena (TI) Caru, município de Bom Jardim (MA), como protesto contra a empresa Vale. Na ocasião, os Awá argumentaram que a mineradora descumpria os acordos previstos no Plano Básico Ambiental (PBA) para diminuir os impactos da ampliação da EFC aos modos de vida dos povos indígenas na região.

Durante a segunda audiência de instrução e julgamento, ocorrida em 27 de fevereiro, os Awá testemunharam a favor do Cimi, reafirmando o trabalho realizado e o compromisso da instituição com os direitos do povo. “A Vale, pelo que disseram os Awá na audiência, diante da juíza do caso, não vinha cumprindo acordos de compensação por ilegalmente usar a terra indígena para transportar sua produção. Ilegalmente, porque a Constituição não permite uso de terras indígenas por terceiros”, afirma Rafael Modesto.

“A Vale, pelo que disseram os Awá na audiência, diante da juíza do caso, não vinha cumprindo acordos de compensação por ilegalmente usar a terra indígena para transportar sua produção”

A liderança Tatuxa’a Awá Guajá explica que a atuação do Cimi foi importante para o processo de aprendizagem bilíngue e para conhecer sobre os seus direitos. Tatuxa’a destaca, ainda, que a ação de interdição da EFC aconteceu devido ao descumprimento dos acordos entre a empresa e os povos indígenas da TI Caru. “Quando o Cimi chegou aqui para dar aula, as lideranças já tinham decidido fazer essa paralisação. O Cimi chegou lá sem saber”, finaliza.

POR JESICA CARVALHO, DA ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO DO CIMI REGIONAL MARANHÃO