Dez anos depois de Mariana, o Brasil caminha para a COP 30 com as mineradoras à mesa
5 de novembro, 2025


Relatório alerta que o país corre o risco de repetir as mesmas injustiças que devastaram o Rio Doce

Área afetada pelo rompimento de barragem no distrito de Bento Rodrigues, zona rural de Mariana, em Minas Gerais | Foto: Antonio Cruz (Agência Brasil)

Dez anos após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), as feridas daquele crime socioambiental continuam abertas. O desastre, considerado o maior da história do país, matou 19 pessoas, destruiu comunidades inteiras, contaminou o Rio Doce e afetou mais de 40 municípios em Minas Gerais e no Espírito Santo. Uma década depois, a reparação plena ainda não chegou. A impunidade segue sendo a marca do modelo mineral brasileiro.

Enquanto os atingidos seguem lutando por justiça, o Brasil se prepara para sediar, entre 10 e 21 de novembro de 2025, a 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 30), em Belém do Pará. O evento é visto como uma oportunidade para o país se reposicionar nas negociações climáticas globais e tentar se afirmar como liderança ambiental e potência do Sul Global. O governo aposta em sua matriz energética predominantemente renovável e nos vastos recursos minerais como trunfos na corrida pela transição energética mundial.

Um novo relatório elaborado pelo Instituto Cordilheira em parceria com o Business & Human Rights Resource Centre acende o alerta. O estudo “Minerais de transição, velhas desigualdades no Brasil: mineração, justiça e a agenda climática na COP 30” aponta que o debate sobre o papel dos minerais na transição energética tende a ganhar força durante a COP de Belém. Mas adverte que esse debate não pode servir de justificativa para uma nova onda de expansão predatória da mineração, apresentada como “solução mágica” para a crise climática.

Assinado por Gabriel Strautman, Danilo Chammas e Carolina de Moura Campos, o relatório analisa políticas públicas do setor mineral, dados sobre conflitos sociais e as falhas na responsabilização de empresas envolvidas em desastres como os de Mariana e Brumadinho. Em ambos os casos, ninguém foi criminalmente punido e a mineração já foi retomada nas mesmas áreas onde ocorreram as tragédias.

Dez anos, dez verdades

Essas são algumas das verdades que moldam o cenário atual de um país que ainda não aprendeu com suas ruínas. Às vésperas da COP 30, cresce o alerta: o Brasil corre o risco de repetir velhas fórmulas sob o disfarce da “economia verde”, abrindo novas zonas de sacrifício em nome da corrida pelos minerais da transição, como bauxita, cobre, níquel e lítio, essenciais para a indústria das baterias e das energias renováveis.

  1. Mariana não foi acidente.
  2. A reparação nunca chegou.
  3. A mineração continua crescendo.
  4. A ANM está sob suspeita.
  5. O Congresso quer liberar mineração em Terras Indígenas.
  6. O PL da Devastação ameaça o licenciamento ambiental.
  7. O lobby minerário avança sobre a Amazônia.
  8. A transição energética está sendo feita à base de destruição.
  9. COP 30 com as mineradoras à mesa.
  10.  Justiça climática é justiça para Mariana.

A COP sob a sombra de Mariana e Brumadinho (MG)

A coincidência entre a realização da COP 30 e o décimo aniversário do rompimento da barragem de Fundão é, segundo o relatório, um alerta simbólico. O colapso de 5 de novembro de 2015 liberou mais de 43 milhões de metros cúbicos de rejeitos no Rio Doce, destruiu vilas inteiras, matou 19 pessoas e deixou centenas desabrigadas. Quatro anos depois, a tragédia de Brumadinho mostrou que nada havia sido aprendido: a barragem da Vale se rompeu e matou 272 pessoas, incluindo dois bebês ainda não nascidos.

Memória e destruição: Entre a lama e a transição energética, o país que sonha com o futuro verde sem curar suas feridas. | Foto: Catarina Barbosa (Instituto Guaicuy)

Para os autores do estudo, a expansão da mineração de minerais de transição não pode repetir os padrões de injustiça, violações de direitos humanos e impunidade corporativa que marcaram as duas maiores tragédias ambientais do país. “Resolver a crise climática não pode acontecer ao custo do aprofundamento das desigualdades e da perpetuação de um modelo extrativista abusivo e secular”, alerta o documento.

Justiça climática é justiça para Mariana

O relatório defende que o debate climático brasileiro precisa incorporar, no centro, os princípios da justiça ambiental e dos direitos humanos. Não há futuro sustentável possível enquanto comunidades atingidas seguirem sem reparação e territórios amazônicos continuarem ameaçados por novas frentes de exploração.

“O Brasil não pode seguir reproduzindo as mesmas desigualdades que envenenam seus rios e comunidades”, afirmam os autores. Para eles, “a COP 30 não pode ser a COP das mineradoras”. Justiça climática, concluem, é também justiça para Mariana.