14º Encontro Regional de Atingidas e Atingidos pela Mineração consolida estratégias comunitárias contra o neoextrativismo no Corredor Carajás

14º Encontro Regional de Atingidas e Atingidos pela Mineração consolida estratégias comunitárias contra o neoextrativismo no Corredor Carajás

Realizado em São Luís (MA), o ERAM reuniu comunidades do Pará e Maranhão entre os dias 15 e 17 de agosto, mobilizando indígenas, quilombolas, ribeirinhos e organizações sociais para debater os impactos da mineração e traçar estratégias de resistência ao modelo extrativista. 

“Quatorze anos de articulação, troca e resistência. Do EJAM ao ERAM, das comunidades do Maranhão e Pará aos espaços nacionais e internacionais, a luta continua firme, com os pés no território e o coração na vida. Foto: Denyse Nunes (CPP)

No começo de agosto, comunidades do Pará e Maranhão se reuniram entre os dias 15 e 17, em São Luís (MA), para traçar análises e estratégias de enfrentamento aos projetos extrativistas na Amazônia. O XIV Encontro Regional de Atingidos e Atingidas pela Mineração (ERAM) mobilizou indígenas, quilombolas, ribeirinhos, comunidades urbanas, religiosos e organizações sociais que enfrentam o avanço da mineração e do agronegócio na região. Nesses três dias, cerca de 75 pessoas debateram o modelo mineral brasileiro, seus impactos na crise climática e as estratégias de (r)existência das comunidades.

Na manhã do sábado (16), o encontro foi aberto com uma mística de memória e espiritualidade, que resgatou os quatorze anos de construção conjunta da articulação. Em roda, os participantes lembraram nomes de defensores e defensoras dos direitos humanos e da natureza que se foram recentemente, como Anacleta Pires, liderança quilombola de Santa Rosa dos Pretos (MA), e dona Máxima Pires, da comunidade Rio dos Cachorros (MA). Ambas ancestralizaram em 2024, mas foram lembradas como sementes que seguem fortalecendo a defesa do Bem Viver nos territórios.

Na análise de conjuntura do ERAM, vozes diversas se encontraram para rasgar o véu do modelo mineral brasileiro e seus impactos na crise climática. Do direito popular de Diogo Cabral à pesquisa comprometida de Cindía Brustolini e Ailce Margarida Alves, o debate mostrou que justiça, memória e saberes partilhados se entrelaçam na defesa dos bens comuns e na construção de mundos possíveis. Foto: Yanna Duarte


Conjuntura: territórios sob ataque

A primeira atividade reuniu lideranças para uma análise das ameaças socioambientais que atravessam Maranhão e Pará.

Quem vive na pele, fala primeiro: na troca de experiências do ERAM, lideranças indígenas, quilombolas, ribeirinhas e agricultoras expuseram as feridas abertas pela mineração no Maranhão e no Pará. Da voz de Vanusa Guajajara, lembrando que os jovens são os mais impactados; à denúncia de Joércio Pires sobre a titulação emperrada no Incra; passando pelo grito de Eva Moraes contra a explosão do rio; até o sonho de Ana Nair por ‘todos os mundos possíveis’. Resistir, aqui, é cuidar do território, da memória e da vida que insiste em florescer. Foto: Yanna Duarte


Vanusa Guajajara, liderança da Aldeia Piçarra Preta, na Terra Indígena Rio Pindaré (MA), destacou que a relação com o território é a base da luta por direito à terra, comida e segurança. Mas alertou: “Os jovens são os mais impactados. Grandes empresas destroem o sentido de comunidade e afetam a saúde mental deles”. Vanusa também mencionou a disputa em torno do Plano Básico Ambiental (PBA) do Componente Indígena, que ameaça direitos dos povos originários.

Joércio Pires, quilombola e educador popular do Quilombo Santa Rosa dos Pretos (MA), expôs a resistência da comunidade diante de cinco grandes empreendimentos que avançam sobre o território. Ele denunciou a cooptação de lideranças pelas empresas e as promessas não cumpridas de emprego, escolas e saúde: “Enquanto isso, a titulação do território segue emperrada no Incra”.

Eva Moraes, jovem da comunidade Praia Alta (PA), denunciou o projeto de explosão de 35 km de rochas no Pedral do Lourenção, etapa crucial para abrir uma hidrovia que transportará grãos e minérios. “Eles falam em derrocagem, mas nós falamos em explodir. Querem explodir o rio, que é vida, peixe e sustento das famílias”, afirmou. Ela lembrou ainda que a região já sofre com os impactos da barragem de Tucuruí.

Ana Nair, agricultora do movimento Xingu Vivo (PA), trouxe a realidade da Volta Grande do Xingu e criticou a postura do Incra: “O órgão que deveria garantir terra ao povo age como braço do Estado na reprodução da violência. Se o Incra não cumpre seu papel, por que existe?”. Para ela, resistir é também cuidar da “lagoa misteriosa”, símbolo da diversidade que as mineradoras tentam apagar: “Quando a mineração chega, para elas só existe o mundo da mineração. Nós sonhamos com todos os mundos possíveis”.

Resex Tauá-Mirim: o território que resiste à engrenagem da mineração e do agronegócio 

Na tarde do sábado, os participantes do ERAM visitaram a comunidade do Taim, uma das 12 que formam a área da Resex Tauá-Mirim, reivindicada há mais de 22 anos. Cerca de 2.200 famílias aguardam a decretação oficial da reserva pelo presidente Lula, enquanto enfrentam a expansão de portos, indústrias e mineradoras.

Fran Gonçalves, moradora local, guiou a visita e relatou o cotidiano de violações: mortandade de peixes, contaminação do ar e expulsão de famílias. “A Resex é nosso direito de viver da pesca artesanal, da agricultura e das tradições. Enquanto o complexo portuário nos cobre de pó preto, nós seguimos preservando a natureza e nossa cultura”, afirmou.

Na comunidade Taim, parte da Resex Tauá-Mirim, o ERAM caminhou para ver, ouvir e sentir o chão onde a luta acontece. Entre rios, tambores e poeira de portos, a visita de campo revelou o território que resiste e reafirma a vida diante do avanço da destruição. Foto: Lanna Luz


A paisagem entre a saída de São Luís e a zona rural revela o impacto: estradas tomadas por lama marrom, ar saturado de partículas e instalações industriais cobertas pelo pó preto. Ainda assim, o território guarda a força do tambor de crioula, das encantarias e da agricultura tradicional, resistindo como contraponto ao avanço da destruição.


“Que progresso é esse?”

O domingo (17) começou com uma mística organizada por lideranças do Pará, que questionava:

“Que progresso é esse que nos divide, semeia discórdia, nos joga nas periferias e nos faz mais pobres?”

A provocação abriu espaço para a divisão em grupos de trabalho, que discutiram:

  • Comunicação popular e uso crítico de tecnologias, como inteligência artificial;
  • Orçamento público e CFEM (Compensação Financeira pela Exploração Mineral);
  • Proteção de defensores e defensoras de direitos humanos e da natureza;
  • Corredores logísticos (ferrovias, hidrovias, rodovias) e seus impactos nos territórios.
Que progresso é esse que destrói, divide e empobrece? No ERAM, a pergunta se transforma em ação: comunicação popular, proteção de defensores, cuidado com os rios e a terra, resistência coletiva. Foto: Yanna Duarte

ERAM: 14 anos de articulação

O Encontro Regional de Atingidos e Atingidas pela Mineração (ERAM) surgiu da necessidade de unificar lutas que antes eram isoladas, explica Larissa Santos, coordenadora política da Justiça nos Trilhos (JnT):

“Era preciso juntar comunidades do Maranhão e Pará para debater como o modelo mineral violenta a vida cotidiana e traçar estratégias coletivas. Assim nasceu o ERAM, como espaço de intercâmbio e articulação regional”.

O encontro é hoje a principal articulação da JnT, com parceria histórica da CPT Marabá , do MST, do CEPASP, de sindicatos rurais e de inúmeras comunidades. Nos primeiros anos, houve até um espaço paralelo para a juventude – o Encontro de Jovens Atingidos pela Mineração (EJAM) –, que depois foi incorporado ao ERAM, ampliando metodologias e a participação de diferentes gerações.

Entre conquistas e novos desafios

Ao longo de 14 anos, o ERAM atravessou criminalizações, perseguições, assassinatos de lideranças e até a pandemia. Ainda assim, acumula conquistas: assentamentos consolidados no Pará, o reassentamento das 312 famílias de Piquiá de Baixo (MA) para o novo bairro Piquiá da Conquista, e contribuiu para criação de espaços nacionais e internacionais de articulação, como o MAM, a AIAAV e o Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração.

Para Mikaell Carvalho, coordenador da JnT, o encontro amadureceu junto com as comunidades:

“O inimigo continua o mesmo – mineradoras e Estado que violam direitos. Mas hoje temos mais organizações mobilizadas, mais jovens em posições estratégicas e maior capacidade de articular resistências. O ERAM é a articulação mais importante que temos, porque nasce e se mantém com os pés no território”.

por Lanna Luz e Yanna Duarte

Após dez meses da entrega das casas em Piquiá da Conquista, mais 67 famílias de Piquiá de Baixo recebem as chaves no Jardim Aulídia

Após dez meses da entrega das casas em Piquiá da Conquista, mais 67 famílias de Piquiá de Baixo recebem as chaves no Jardim Aulídia

Enquanto 312 famílias foram reassentadas em outubro de 2024, outras 67 famílias, formadas ao longo dos anos em que o processo de construção das casas estava em andamento, seguiram em luta até serem incluídas no projeto habitacional, garantindo a continuidade do direito à moradia digna para quem permaneceu em condições insustentáveis no bairro Piquiá de Baixo.

Mulheres de Piquiá de Baixo reivindicando aluguel social em fevereiro deste ano, durante espera na entrega das casas no Jardim Aulídia. Foto: Yanna Duarte.

A luta por moradia digna em Piquiá de Baixo ganhou um novo capítulo no último dia 1º de agosto, com a entrega das chaves para 67 famílias no bairro Jardim Aulídia, em Açailândia (MA). Essas famílias se formaram durante o período de mobilização e construção, em um processo que, após décadas, já tinha as burocracias do reassentamento das 312 famílias no bairro Piquiá da Conquista encaminhadas.

Essas 67 famílias sempre estiveram acompanhadas e apoiadas pelas organizações parceiras, como Justiça nos Trilhos (JnT), Missionários Combonianos e a Associação de Moradores e Moradoras de Piquiá (ACMP), que seguiram atuando para garantir que seus direitos fossem contemplados. A situação de Piquiá de Baixo, marcada pela falta de condições adequadas de moradia, saúde e segurança, evidenciou a necessidade de avançar em novas medidas.

Diante desse cenário, e após forte mobilização popular junto aos órgãos públicos, essas famílias foram incluídas em uma nova etapa do programa Minha Casa Minha Vida, garantindo o acesso à moradia digna no Jardim Aulídia.

Na ocasião, a comunicadora popular e educadora física Sebastiana Ferreira, uma das lideranças da luta por moradia digna e justiça socioambiental em Piquiá de Baixo, relembrou as dificuldades enfrentadas até a entrega das casas:

“Tô muito feliz, finalmente a gente teve nossas casas entregues, depois de muita luta. O mato já estava invadindo as casas e a estrutura estava muito precária no antigo bairro”, disse ela.

Em fevereiro deste ano, as mulheres de Piquiá de Baixo, em conjunto com a Associação Comunitária dos Moradores de Piquiá (ACMP), protocolaram um pedido de aluguel social na Secretaria Municipal de Assistência Social (Semas) de Açailândia, devido às condições precárias de moradia no bairro, abandonado pelo poder público municipal desde antes, mas cuja situação se agravou após a mudança das 312 famílias para Piquiá da Conquista.

Sebastiana e sua irmã, Simone Costa, representam um dos casos em que os pais foram contemplados com casas no bairro Piquiá da Conquista, em um processo coletivo e histórico de luta pelos direitos humanos e pela saúde, longe do foco de poluição industrial direta das siderúrgicas ao redor. No entanto, as duas irmãs decidiram não participar do processo na época e, quando ocorreu a entrega das casas em Piquiá da Conquista, elas e outras famílias ainda aguardavam as moradias no Jardim Aulídia.

Sebastiana Ferreira e integrantes da ACMP na entrega das chaves no bairro Jardim Aulídia. Foto: Sebastiana.

Relembre um pouco do processo

Antes de o novo bairro Piquiá da Conquista se tornar realidade, a comunidade de Piquiá de Baixo enfrentou uma longa batalha contra a poluição causada pela cadeia logística da mineração, coordenada pela Vale S.A. e pelas siderúrgicas locais.

A poluição começou na década de 1980, quando o escoamento de minério de ferro e a produção siderúrgica afetaram drasticamente a qualidade de vida dos moradores. Em 2008, a comunidade votou pelo reassentamento, que só se concretizou após mais de uma década de intensa mobilização, com protestos e negociações envolvendo o Ministério Público, a Associação de Moradores (ACMP) e as empresas.

Vitória da Esperança: a luta de Piquiá de Baixo pela moradia digna

No dia 7 de outubro de 2024, os moradores assinaram os contratos das casas no novo bairro Piquiá da Conquista. A cerimônia foi organizada pela ACMP e pela Caixa Econômica Federal, com o apoio da Justiça nos Trilhos.

Finalmente, no dia 25 de outubro de 2024, um evento aguardado por mais de duas décadas se concretizou: a entrega das chaves do reassentamento Piquiá da Conquista para 312 famílias, marcando o encerramento de um ciclo de luta histórica do povo de Piquiá de Baixo. Embora o novo bairro tenha um nome diferente, para cada morador ele é, e sempre será, a continuidade de Piquiá de Baixo, um símbolo de união popular, preservação de raízes e força coletiva.

Luta pela memória e pela reparação integral

Com a inauguração de Piquiá da Conquista, a comunidade já vislumbra o próximo desafio: transformar o bairro Piquiá de Baixo em um Parque Ambiental. A mediação do Ministério Público visa garantir que áreas como o cemitério, a escola e algumas casas sejam preservadas, criando um espaço que atue como memorial vivo da resistência e das batalhas travadas por justiça ambiental.

A comunidade reforça que a reparação integral ainda está longe de ser alcançada. As empresas responsáveis pela degradação precisam ser responsabilizadas, e o Estado deve cumprir seu papel de fiscalização, para que a poluição na área total de Piquiá de Baixo seja controlada e mitigada. Embora 312 famílias tenham sido reassentadas, muitas outras continuam vivendo em Piquiá, ainda expostas à contaminação e necessitando de soluções urgentes.

Revista Não Vale V — uma edição histórica

Em uma edição histórica, que traça o início de todo o processo de luta por justiça socioambiental, desde a carta escrita por Edvard Dantas ao então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2007, a nova edição da Revista Não Vale escuta crianças, jovens e lideranças antigas para narrar toda a trajetória de resistência. Com lançamento previsto para setembro deste ano, a revista trará reportagens, perfis, ensaios e cordéis sobre a comunidade de Piquiá de Baixo.

Acesse as edições anteriores aqui.

Por Yanna Duarte

Edição de Lanna Luz

O Maranhão resiste: contra o PL da Devastação e em defesa da vida

O Maranhão resiste: contra o PL da Devastação e em defesa da vida

Em nome da vida e dos povos, #VETALULA já!

A defesa dos nossos territórios no Maranhão nunca foi tão urgente. Com a aprovação do Projeto de Lei 2.159/2021, conhecido como PL da Devastação, a Câmara dos Deputados lança uma ameaça direta às florestas, aos rios, às comunidades tradicionais e à própria vida que sustenta tudo isso.

A sessão, conduzida pelo deputado Hugo Motta, do Republicanos da Paraíba, terminou com 267 votos favoráveis. Essa proposta expressa o avanço da bancada ruralista e do agronegócio, que buscam enfraquecer a proteção ambiental e silenciar as vozes de quem vive, cuida e resiste nos territórios. Dos deputados maranhenses, 12 votaram a favor do projeto: Allan Garcês (PP), Aluisio Mendes (Republicanos), Amanda Gentil (PP), Cleber Verde (MDB), Detinha (PL), Duarte Jr (PSB), Fábio Macedo (Podemos), Josimar Maranhãozinho (PL), Josivaldo JP (PSD), Juscelino Filho (União Brasil), Márcio Honaiser (PDT) e Pastor Gil (PL).

Esse projeto altera, de forma perigosa, as regras de licenciamento ambiental no Brasil. Acaba com a exigência de estudos de impacto para atividades que podem gerar sérios danos à natureza e às comunidades. Enfraquece os órgãos de fiscalização e abre caminho para que obras avancem sem qualquer diálogo com as populações diretamente afetadas.

Pior ainda, o texto aprovado amplia o chamado autolicenciamento. Isso significa que grandes empreendimentos com alto potencial destrutivo, como a mineração e o agronegócio em larga escala, poderão ser autorizados por meio de um simples formulário online, sem nenhuma análise técnica prévia. Sem escuta. Sem responsabilidade real. Na prática, é uma carta branca para destruir.

Esse tipo de flexibilização torna ainda mais provável que tragédias como as de Brumadinho e Mariana se repitam. E mais: exclui a obrigatoriedade de licenciamento para diversas atividades do agronegócio, como monoculturas de soja e milho e a pecuária extensiva, práticas que já provocam desmatamento, envenenamento do solo e da água, além da expulsão sistemática de comunidades tradicionais.

Embora afirme regulamentar o artigo 225 da Constituição Federal, que garante o direito de todos a um meio ambiente equilibrado, o projeto deturpa esse princípio. Em vez de proteger o presente e o futuro, entrega os territórios ao lucro desenfreado. É o avanço de um modelo que transforma a terra em mercadoria e o povo em obstáculo.

O PL da Devastação é mais uma peça no projeto de um capitalismo extrativista que cerca, devasta e saqueia nossas florestas, nossos rios e nossas vidas. Ele empurra comunidades inteiras para fora de seus modos de vida, destrói ecossistemas, apaga culturas e agrava a crise climática que já castiga nosso dia a dia.

Enquanto o calor queima as cidades e o solo racha nos campos, a elite econômica e política trabalha para facilitar obras e empreendimentos que não têm qualquer compromisso com a vida, com os territórios ou com as futuras gerações. Tudo isso enquanto o Brasil se prepara para sediar a COP 30, uma conferência internacional sobre mudanças climáticas que, ironicamente, acontecerá no mesmo país onde se aprovam projetos que aceleram a devastação ambiental e aprofundam a crise climática.

No Maranhão, sabemos exatamente o que isso representa. É mais desrespeito com as comunidades já afetadas pelos grandes empreendimentos. Mais invasões em terras quilombolas da Baixada, do Munim e de Itapecuru-Mirim. Mais ameaças aos povos indígenas Tremembé, Awá-Guajá, Canela e tantos outros. É o avanço da monocultura, do uso intensivo de agrotóxicos, a construção de barragens que comprometem nossos rios e a expulsão das famílias que vivem do babaçu, da pesca, do roçado e da floresta.

Um exemplo emblemático é o Projeto Grão Pará (GPM), que prevê a construção de um porto de águas profundas em Alcântara e uma ferrovia de 540 km ligando o porto à cidade de Açailândia. Trata-se de um empreendimento de grande impacto socioambiental. Além disso, não podemos esquecer as constantes ameaças à Reserva Extrativista Tauá-Mirim, que também sofre com a pressão desses grandes projetos.

Como nos lembra Nêgo Bispo, filósofo, poeta e quilombola do Piauí: “A terra dá, a terra quer.” Ela oferece alimento, sombra, abrigo, mas também exige cuidado, escuta e reciprocidade. A terra não é coisa, é sujeito. Ela sente e responde. E agora, ela está gritando. Grita nas secas prolongadas, nas enchentes repentinas, no calor insuportável, nas florestas que tombam.

Os grandes projetos do capitalismo extrativista impulsionam o cercamento e desmatamento das florestas brasileiras e de sua biodiversidade. Deslocam milhões de pessoas de suas terras e modos de vida, destroem ecossistemas e causam o desaparecimento de mundos socioculturais inteiros. A consequência é uma crise climática que se aprofunda a cada dia.

Esse projeto de lei tenta calar os rios, sufocar as matas, silenciar os modos de vida que sustentam este país há séculos. Como também disse Bispo: “A gente é contra o progresso que passa por cima da gente.” E é exatamente isso que o PL da Devastação representa. Um falso progresso que atropela territórios, apaga culturas e desrespeita os povos originários e tradicionais.

Contudo, o Maranhão resiste. Resiste com seus tambores, com suas águas, seus quilombos, suas aldeias, suas quebradeiras de coco e pescadores. Resiste com a força de quem sabe que defender a terra é defender a vida.

É hora de se levantar. De denunciar. De se organizar.

A terra quer respeito. E nós também.