Vale condenada por provocar incêndio ao esmerilhar os trilhos | Justiça nos Trilhos
21 de setembro, 2013

O juiz Ângelo Alencar dos Santos, da comarca de Açailândia-MA, condenou a Vale a indenização de danos materiais e morais por ter provocado incêndio em 30 alqueires de pastagem de uma fazenda, por causa do esmerilhamento dos trilhos da ferrovia. A indenização é de mais de 150mil reais.

Várias outras comunidades sofrem pelos outros problemas. Em 2010, as comunidades do interior do município de Açailândia foram gravemente ameaçadas pela extensão do incêndio até à entrada dos assentamentos. Veja aqui um artigo a respeito desse acidente e, a seguir, a sentença do juiz dr. Ângelo.

SENTENÇA

1. RELATÓRIO:

Trata-se de ação de reparação por danos materiais e morais, ajuizada por Joaquim Costa Filho em face da Companhia Vale do Rio Doce, ambos já qualificados nos autos, alegando em apertada síntese que teve sua propriedade atingida por incêndio provocado por empregados da empresa ré que trabalhavam na manutenção da ferrovia, ocasionando sérios danos de ordem patrimonial e moral. Pede a condenação pelos danos sofridos. Citada, a requerida não apresentou contestação. Em replica a autora pede seja decretada a revelia e julgamento antecipado da lide. Vieram-me os autos conclusos. Decido.

2. FUNDAMENTAÇÃO:

De inicio, cumpre salientar que, apesar de devidamente citado, o réu não tomou qualquer dessas providências, deixando de apresentar contestação, o que leva ao reconhecimento de sua revelia, caso em que deve incidir o efeito de se presumirem verdadeiros os fatos alegados na inicial, comportando assim, julgamento antecipado nos termos do artigo 330 II do CPC. No que tange ao mérito, a partir dos fatos articulados e elementos de provas coligidos, infere-se que em outubro de 2010 a propriedade rural do autor, destinada à criação de gado leiteiro, dentre outras atividades secundarias, foi atingida por arrasador incêndio, supostamente originado pela realização de atividades de manutenção da ferrovia por parte de empregados da empresa ré, com a utilização de trem esmerilhador utilizado na lixa dos trilhos da ferrovia, para reparos na linha férrea. Ocorre que referido trem, quando em atividade, produz enorme quantidade de fagulhas, que tornam uma espécie de jato de fogo em razão do atrito. Assim, em razão do seu grande potencial incendiário, aliado a vegetação seca e de fácil combustão, constante nessa época do ano, deu-se inicio ao incêndio que alcançou a propriedade do requerido causando-lhe diversos danos, conforme bem restou comprovado nos autos. Em virtude disso, ajuizou o autor, a presente ação indenizatória sustentando, para tanto, que quase a totalidade da pastagem em seu terreno pereceu, o qual estimou em 30 alqueires de pasto foram atingidos pelo fogo. Com efeito, a tese inicial vem amplamente corroborada através de prova acostada, o qual concluiu por imprestáveis os 30 alqueires de pasto queimados do terreno do autor, alem das benfeitorias e prejuízos com os semoventes de sua propriedade. E, ademais, restou bem delineada a dinâmica do evento lesivo e, bem assim, a culpa da requerida para a deflagração do prejuízo experimentado pelo autor, eis que, as provas são contundentes em demonstrar que tal incidente ocorreu, em virtude da negligencia, por parte da empresa ré, na realização de determinados instrumentos na manutenção da ferrovia e à ausência dos pertinentes e necessários cuidados para evitar a propagação das chamas, conforme faz prova as imagens feitas na área afetada e os demais documentos juntados aos autos. Caracterizada, portanto, a responsabilidade civil do requerido, a teor dos arts. 186 e 927 do Código Civil , eis que configura ato ilícito e gera, de conseguinte, a obrigação de indenizar, a conduta da requerida que, ao iniciar os trabalhos de manutenção da ferrovia, não se cercou dos devidos cuidados, não conseguindo evitar a propagação das chamas, ao ponto delas consumirem considerável área da propriedade do requerente. Nesta esteira, a demanda é clara e o tema não merece maiores dilações, posto que, resta comprovado o dano sofrido pelo autor, que teve sua propriedade atingida por incêndio ocasionado por culpa de prepostos da requerida. Assim, resta-nos, tão somente delimitar a extensão do dano patrimonial, assim, da planilha de cálculos elaborada pelo requerente bem como a juntada de notas e orçamentos, depreende-se o dano no valor de R$ 146.000,00 (cento quarenta e seis mil reais). Portanto, comprovados o prejuízo e a extensão deste, impõe-se a condenação do demandado quanto ao dano material suportado pelo demandante, no montante de R$ 146.000,00. No tocante ao quantum da indenização, é verdade que o patrimônio moral das pessoas físicas e jurídicas não pode ser transformado em fonte de lucro ou pólo de obtenção de riqueza. Não se admite a indenização como instrumento de enriquecimento ilimitado do ofendido. É certo, outrossim, que a reparação por danos morais tem caráter pedagógico, devendo-se observar a proporcionalidade e a razoabilidade na fixação dos valores, atendidas as condições do ofensor, ofendido e do bem jurídico lesado. Essa é a orientação de Rui Stoco: “Tratando-se de dano moral, nas hipóteses em que a lei não estabelece os critérios de reparação, impõe-se obediência ao que podemos chamar de ‘binômio do equilíbrio’, de sorte que a compensação pela ofensa irrogada não deve ser fonte de enriquecimento para quem recebe, nem causa da ruína para quem dá. Mas também não pode ser tão apequenada que não sirva de desestímulo ao ofensor, ou tão insignificante que não compense e satisfaça o ofendido, nem o console e contribua para a superação do agravo recebido. “Na fixação do quantum a título de compensação por dano moral o julgador não pode se afastar de um princípio basilar: a vítima da ofensa deve ter por objetivo único a busca de uma compensação para um sentimento ruim e não o de obter vantagem, nem de receber um valor que jamais conseguiria com a força do seu próprio trabalho”. (STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil . 7. ed. São Paulo: RT, 2007, p. 1236-1237) Nestas circunstâncias, considerando a gravidade do ato ilícito praticado contra o autor, que viu sua propriedade ser incendiada em virtude de um descuido da demandada, conforme restou reconhecido, o potencial econômico da requerida, o caráter punitivo-compensatório da indenização e os parâmetros adotados em casos semelhantes, fixo o valor da indenização em R$ 6.780,00 (seis mil setecentos e oitenta reais), o equivalente a 10 (dez) salários mínimos.

3. DISPOSITIVO:

Ante ao exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS, com resolução do mérito, nos termos do Artigo 269, inciso I do Código de Processo Civil para: a) CONDENAR a parte requerida VALE S.A, ao pagamento de R$ 146.000,00 (cento e quarenta e seis mil reais) à titulo de danos materiais ao autor JOAQUIM COSTA FILHO, acrescidos de juros de 1% (um por cento) ao mês, e correção monetária com base no INPC, ambos a contar da data do evento danoso (súmulas 43 e 54 STJ). b) CONDENAR ainda a título de danos morais a requerida ao pagamento da quantia de R$ 6.780,00 (Seis mil setecentos e oitenta reais), a titulo de dano moral, acrescidos de juros de 1% ao mês, a contar da data do evento danoso, e correção monetária com base no INPC, contados da data da presente sentença. Custas pelo requerido, na forma da Lei. Arbitro a verba honorária em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação. Publique-se. Registrem-se. Intimem-se as partes do teor da presente condenação. Cumpra-se.

Açailândia/MA, 12.06.2013.

Angelo Antonio Alencar dos Santos

Juiz de Direito Resp: 120048