Mulheres em Resistência | O encontro pré-ERAM e o direito à memória

Mulheres em Resistência | O encontro pré-ERAM e o direito à memória

Atingidas pela mineração e agronegócio se reúnem em Piquiá da Conquista para fortalecer a luta pelo direito à memória e denunciar os impactos desses empreendimentos em seus territórios.

“A única luta que se perde é a que se abandona”. Fotos: Thiago Santos

No dia 25 de janeiro de 2025, cerca de 30 mulheres se reuniram em Piquiá da Conquista, em Açailândia (MA), para fortalecer a luta pelo direito à memória da comunidade de Piquiá de Baixo. O encontro foi um marco na construção de estratégias de resistência contra os impactos da mineração e do agronegócio no Corredor Carajás, fortalecendo laços de solidariedade entre as mulheres atingidas.

Essa mobilização integrou a etapa preparatória para o Encontro Regional dos Atingidos e Atingidas pela Mineração e o Agronegócio (ERAM), reunindo mulheres de diferentes territórios do Brasil — Maranhão, Pará, Minas Gerais, Rio de Janeiro e outras regiões — em um espaço de articulação, denúncia e memória viva. Durante as atividades, as participantes reafirmaram o compromisso coletivo de registrar e difundir suas histórias, garantindo que suas lutas não sejam apagadas.

A programação iniciou no Centro Comunitário de Piquiá de Baixo, de onde as mulheres partiram em caminhada, com cartazes e palavras de ordem em defesa dos modos de vida das comunidades tradicionais. O ato também prestou uma homenagem emocionante às vítimas do crime socioambiental de Brumadinho (MG), que completava seis anos na mesma data.

A luta da comunidade de Piquiá de Baixo contra a poluição causada pela cadeia da mineração resultou no reassentamento de 312 famílias para o bairro Piquiá da Conquista, buscando afastá-las dos impactos diretos da poluição do ar e sonora. As mulheres presentes discutiram como essas violações afetam seus corpos e suas realidades, conectando experiências de diferentes territórios.

“Em Piquiá de Baixo, sofremos muitos impactos, como a poluição sonora e do pó de ferro. Muitas famílias tiveram seus filhos queimados pela munha, além dos acidentes na BR-222 por conta dos caminhões. Estávamos cercados pela Estrada de Ferro Carajás e, por outro lado, pelas empresas produtoras de minério de ferro”, relatou uma das participantes.

O direito à memória reivindicado pelas mulheres é parte do conceito de reparação integral, que reconhece a importância de contar suas próprias histórias para que as violações sofridas não se repitam.

Larissa Santos, coordenadora política da Justiça nos Trilhos, enfatizou a importância de documentar e compartilhar esses relatos: “A memória é um direito, e as comunidades violadas devem ter a liberdade de contar suas versões para que sejam respeitadas”.

Margarida Negreiros, que viajou de Marabá (PA) para participar do encontro, destacou como a realidade de sua região se assemelha à de Piquiá de Baixo devido à mineração: “Eu tinha muita curiosidade de conhecer Piquiá, porque ouço falar há muito tempo sobre as questões que atravessam esse território, que foi tomado das pessoas para que a mineração se estabelecesse”.

O ato foi organizado pela Justiça nos Trilhos no contexto da preparação para o ERAM, que acontecerá ainda este ano. “Temos dialogado para trazer as mulheres e debater as questões vivenciadas nos territórios. A ideia do encontro foi mobilizar elementos para debatermos no ERAM”, concluiu Margarida Negreiros.


Dessa experiência transformadora nasceu o documentário “Memórias”, uma produção audiovisual fruto da formação “Veias Abertas da América Latina: Resistência, Comunicação e Cultura”, realizada de 22 a 26 de janeiro. A iniciativa buscou fortalecer redes de resistência cultural e política, criando espaços de troca, formação e comunicação popular para comunidades impactadas.

O curta-documentário sobre o encontro de mulheres no pré-ERAM, produzido em parceria com a Justiça nos Trilhos (JnT), o Instituto para Democracia, Mídia e Intercâmbio Cultural da Alemanha (IDEM) | Cooperação Alemã (BMZ), e com o apoio da Agência Zagaia, do Grupo LoveLabCom, da RádioTV Quilombo Rampa e da Mídia Guajajara, já está disponível no YouTube da Justiça nos Trilhos.

Rir para resistir: Oficina de Palhaçaria fortalece mulheres defensoras dos direitos humanos em Açailândia (MA)

Rir para resistir: Oficina de Palhaçaria fortalece mulheres defensoras dos direitos humanos em Açailândia (MA)

Iniciativa promove arte e descontração para mulheres assentadas e moradoras de Piquiá da Conquista, resgatando a alegria e a expressividade como ferramentas de empoderamento e luta

Oficina de Palhaçaria incentiva a essência brincante de mulheres defensoras dos direitos humanos em Açailândia (MA)

Entre os dias 13 e 15 de fevereiro, a oficina “Empoderamento Feminino com Práticas de Palhaçaria” percorreu assentamentos da região de Açailândia (MA) e o bairro Piquiá da Conquista, proporcionando momentos de descontração e expressão artística para mulheres defensoras dos direitos humanos e da natureza.

A atividade foi conduzida pelo grupo artístico Miramundo, sob a coordenação da professora de Artes da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Michelle Cabral. O objetivo do projeto era estimular o relaxamento e a desinibição das participantes por meio da palhaçaria, permitindo que redescobrissem a alegria e a espontaneidade em suas rotinas.

Duas oficinas foram realizadas: uma no assentamento Francisco Romão, voltada para mulheres da comunidade, e outra no bairro Piquiá da Conquista. Essa não foi a primeira passagem do projeto pela região, em 2017, já havia promovido atividades artísticas em parceria com a Justiça nos Trilhos. Entusiasmada com a experiência anterior, Michele procurou a organização para retomar a colaboração.

Professora de Artes, Michelle Cabral.

“A oficina de práticas de palhaçaria realizada pelo projeto Miramundo foi essencial para despertar características que as mulheres já têm, mas que acabam se esquecendo nas suas rotinas diárias. Elas tiveram a oportunidade de potencializar o seu ‘eu’ artístico, a alegria e as crianças brincantes de cada uma. Com isso, elas se reenergizam e ampliam suas criatividades para continuar os trabalhos em suas comunidades, em defesa da vida e da natureza.”

Para Ana Maria, moradora de Piquiá da Conquista, a experiência foi transformadora. “Nunca tinha vivido algo assim, mas a curiosidade me levou até lá. Foi um momento de soltar a voz, de descobrir a palhaça que já existia dentro de cada uma de nós. Quando colocamos o nariz vermelho, parecia que tudo mudava, a timidez foi embora e a gente se sentiu mais leve, mais à vontade. Foi uma vivência única, uma energia coletiva incrível”, contou.

Mulheres de Piquiá da Conquista na oficina de palhaçaria.

E ao final da experiência, uma personagem ficou marcada na memória das participantes: “A Palhaça Palita é sensacional!”, concluiu Ana Maria, com entusiasmo.

Mulheres de Piquiá de Baixo seguem mobilizadas por aluguel social para famílias em situação de vulnerabilidade

Mulheres de Piquiá de Baixo seguem mobilizadas por aluguel social para famílias em situação de vulnerabilidade

Representantes de 64 famílias buscam apoio da Prefeitura de Açailândia para garantir o andamento do processo e o acesso ao aluguel social, enquanto aguardam a entrega das casas no bairro Jardim Aulídia.

Após protocolarem um pedido urgente de aluguel social na Secretaria Municipal de Assistência Social de Açailândia (MA), na segunda-feira (3), mulheres de Piquiá de Baixo aguardam uma resposta concreta da Prefeitura. Representando 64 famílias que ainda vivem no bairro em condições precárias, elas alertam para a urgência da medida, uma vez que o abandono progressivo da área e a derrubada de casas pela Defesa Civil tornaram a permanência no local insustentável.

A maioria das famílias já foi reassentada em Piquiá da Conquista, mas aquelas que permanecem enfrentam um cenário cada vez mais hostil. O mato invade as ruas, as estruturas vazias expõem os vestígios do que um dia foram lares, e a falta de infraestrutura básica torna o cotidiano ainda mais difícil. Diante disso, as mulheres da comunidade assumiram a linha de frente da mobilização, reafirmando a luta histórica do povo de Piquiá por justiça e dignidade.

Agora, a expectativa recai sobre a resposta da Secretaria de Assistência Social. Enquanto isso, o movimento segue pressionando para que nenhuma família fique desamparada nesse período de transição. A possibilidade de reassentamento no Jardim Aulídia representa a promessa de um recomeço, mas, até lá, as famílias exigem medidas imediatas que garantam condições dignas de moradia.