Representantes de 64 famílias buscam apoio da Prefeitura de Açailândia para garantir o andamento do processo e o acesso ao aluguel social, enquanto aguardam a entrega das casas no bairro Jardim Aulídia.
Após protocolarem um pedido urgente de aluguel social na Secretaria Municipal de Assistência Social de Açailândia (MA), na segunda-feira (3), mulheres de Piquiá de Baixo aguardam uma resposta concreta da Prefeitura. Representando 64 famílias que ainda vivem no bairro em condições precárias, elas alertam para a urgência da medida, uma vez que o abandono progressivo da área e a derrubada de casas pela Defesa Civil tornaram a permanência no local insustentável.
A maioria das famílias já foi reassentada em Piquiá da Conquista, mas aquelas que permanecem enfrentam um cenário cada vez mais hostil. O mato invade as ruas, as estruturas vazias expõem os vestígios do que um dia foram lares, e a falta de infraestrutura básica torna o cotidiano ainda mais difícil. Diante disso, as mulheres da comunidade assumiram a linha de frente da mobilização, reafirmando a luta histórica do povo de Piquiá por justiça e dignidade.
Agora, a expectativa recai sobre a resposta da Secretaria de Assistência Social. Enquanto isso, o movimento segue pressionando para que nenhuma família fique desamparada nesse período de transição. A possibilidade de reassentamento no Jardim Aulídia representa a promessa de um recomeço, mas, até lá, as famílias exigem medidas imediatas que garantam condições dignas de moradia.
A entrega das chaves do reassentamento Piquiá da Conquista é o marco de uma trajetória de resistência e esperança, celebrando a força coletiva do povo de Piquiá de Baixo e sua busca por dignidade e justiça.
Solenidade de Abertura da Entrega das Chaves em Piquiá da Conquista | Fotos: Wenner Davisson
No dia 25 de outubro de 2024, um evento aguardado por mais de duas décadas finalmente aconteceu: a entrega das chaves do reassentamento Piquiá da Conquista para 312 famílias, marcando o encerramento de um ciclo de luta histórica do povo de Piquiá de Baixo. Embora o novo bairro tenha um nome diferente, para cada morador ele é, e sempre será, a continuidade de Piquiá de Baixo, simbolizando a união do povo pelo povo, a preservação de suas raízes e de sua força coletiva.
O evento, que estava previsto para começar às 15h, só teve início às 18h com a chegada das autoridades. Esse simbolismo da espera não passou despercebido pelos moradores, que há anos enfrentam batalhas e desafios em busca de dignidade e justiça ambiental. Com lágrimas e abraços, cada chave entregue representou o fim de uma longa espera e o início de uma nova fase, sem deixar para trás a história e a resistência de Piquiá de Baixo.
Andrea da Silva Machado, integrante da Associação Comunitária dos Moradores de Piquiá (ACMP), representou o sentimento coletivo ao ler uma carta-manifesto durante a cerimônia. Suas palavras expressaram gratidão aos parceiros, mas também reforçaram que a luta continua até que a reparação plena seja alcançada. A carta, entregue simbolicamente ao Ministro das Cidades, Jader Filho, e às demais autoridades presentes, foi um ato de afirmação de que a história de Piquiá de Baixo não termina com o novo bairro, mas se expande em Piquiá da Conquista.
Mikaell Carvalho, que passou parte de sua infância em Piquiá de Baixo e hoje atua como coordenador da Associação Justiça nos Trilhos (JnT), destacou o caráter simbólico desse dia de entrega das chaves: “É um dia em que temos também a presença do Estado e das empresas, os mesmos que foram responsáveis pelas violações que a nossa comunidade sofreu. Hoje, retomamos nossa voz e nossa força para dizer a eles que nossa luta por direitos humanos é válida, que esse reassentamento, essa conquista, só foi possível pela nossa resistência. Colocamos todos eles na mesa para construir isso aqui, e agora esperamos que assumam suas responsabilidades, que respondam por suas ações.”
Antônia Flávia, moradora de Piquiá da Conquista, relembrou a importância da união: “O movimento social é a base de tudo. A prova disso está aqui, na união dos moradores de Piquiá da Conquista – que também é Piquiá de Baixo. Se não fosse pela força coletiva, pelo abraço, pelo apoio de cada um, nada disso estaria de pé hoje. Há vinte anos, sonhamos juntos e seguimos lado a lado, com uma fé profunda, mãos dadas, sempre em harmonia.” Ela completou: “Essa luta não se construiu sozinha. Foi moldada na união, na força da fala, no choro, no riso, no afeto. Cada idoso, cada criança, cada jovem, todos juntos nessa caminhada, conectados e determinados a fazer Piquiá da Conquista existir. Como comunidade, aprendemos que a união é o que nos sustenta.”
Após a cerimônia, representantes da ACMP, da Justiça nos Trilhos, dos Missionários Leigos Combonianos e de outras organizações envolvidas nessa trajetória participaram da entrega das chaves e de kits com itens essenciais para as novas casas. Cada entrega foi um ato carregado de significado e de laços fortalecidos ao longo dos anos, um lembrete de que, mais do que um novo bairro, Piquiá da Conquista representa a união de um povo que se manteve firme, preservando sua identidade e construindo, coletivamente, um futuro digno.
Dona Francisca Tida, como é carinhosamente conhecida a presidente da ACMP, expressou sua emoção ao vivenciar esse momento marcante na vida dos moradores de Piquiá de Baixo: “O pessoal está todo aqui, na zoada, esperando para pegar a chave. Meu coração dispara de alegria e felicidade, porque cada pedacinho disso aqui é fruto da nossa luta, uma luta que foi só nossa, das famílias de Piquiá de Baixo.”
E ela ressalta: “Dá uma emoção tão grande, porque quando é a luta do povo, quando é a força da comunidade, as coisas realmente acontecem. Quando a gente se une, com paz e amor, Deus abençoa, e as portas se abrem para a gente.”
Assim, enquanto Piquiá da Conquista começa a tomar forma, ele guarda em seu solo as histórias, memórias e resistências de Piquiá de Baixo, mantendo viva a essência de um povo que, de fato, é e sempre será “Piquiá pelo povo e para o povo.”
Para a moradora Joselma de Oliveira, a mensagem cantarolada em muitos espaços – “Essa luta é nossa, é do povo” – é um exemplo e inspiração para que outras comunidades também se organizem, se unam e lutem pelos seus direitos, garantindo que aquilo que é delas por direito se torne realidade.
Entre relatos de luta e resistência, agricultores e movimentos sociais exigem políticas públicas para o campo e a cidade.
Agricultores (as), assentados, movimentos e organizações sociais presentes no seminário. (Foto: Yanna Duarte)
Aconteceu nesta quinta-feira (07), na Câmara Municipal de Açailândia (MA), o II Seminário Municipal de Desenvolvimento Rural, com o tema “Políticas Públicas para o Campo e a Cidade”. O encontro reuniu agricultores, assentados, sindicatos e movimentos sociais da região de Açailândia, incluindo representantes das comunidades Francisco Romão, Novo Oriente e João do Vale, para discutir e reivindicar a implementação de políticas públicas que integrem o campo e a cidade.
Organizado por uma coalizão que envolve a Justiça nos Trilhos (JnT), o Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST), a Casa das Mulheres Sementes da Terra, a Casa Familiar Rural e o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Açailândia, o seminário destacou as necessidades dos povos do campo em áreas como educação, cultura, lazer e saúde, enfatizando o dever das autoridades municipais recentemente eleitas de garantir esses direitos.
A primeira mesa abordou a “guerra química” contra as populações do campo, intensificada pela monocultura de soja e eucalipto, com a pulverização aérea de agrotóxicos nos acampamentos e assentamentos da região. As lideranças também discutiram questões como a violência nos assentamentos, a falta de postos de saúde nas comunidades, a precariedade das estradas e a necessidade de políticas de apoio às famílias que vivem da terra.
Foto: Yanna Duarte
A história do agricultor Amarildo, apresentada no seminário, é mais um possível caso de câncer subnotificado, decorrente da pulverização de agrotóxicos. Ele contou que, há pouco mais de cinco anos, um de seus filhos foi diagnosticado com câncer. Desde então, a família costuma viajar entre Imperatriz e Açailândia para tratar a doença.
Amarildo calcula que já percorreram mais de 68 mil quilômetros nessas idas e vindas. Em determinado momento, ele precisou alugar uma moradia temporária em Imperatriz. O agricultor começou a suspeitar que o câncer do filho possa ter sido causado pela exposição ao veneno aplicado próximo à terra da família.
Segundo análise feita pelo veículo InfoAmazonia e por pesquisadores da Fiocruz no estado do Mato Grosso, quanto maior o cultivo de soja, maior o risco de câncer e mortes. Crianças e adolescentes de 79 dos 141 municípios do estado têm mais chances de desenvolver e morrer por linfoma não-Hodgkin e leucemia, de nascer com malformações congênitas ou de morrer antes do parto.
“Ninguém quer falar sobre agrotóxicos quando se discute o aumento de doenças como o câncer em comunidades impactadas pela pulverização de veneno. Isso nem aparece nas estatísticas; é subnotificado”, analisa Arlane.
Na segunda mesa, Alcione Rocha, do assentamento Novo Oriente, relatou que a comunidade, que não possui posto de saúde, recebe atendimento médico apenas uma vez por mês. As organizações presentes questionaram a ausência do poder público para ouvir as reivindicações. Embora o seminário tenha sido realizado na Câmara Municipal, apenas três vereadores compareceram ao evento.
A assistente social Silvia Rosana contou que soube do evento pelas redes sociais e destacou a importância de debates como esse entre os movimentos sociais e a população urbana. Ela comentou sobre seu trabalho de atendimento às comunidades e como estas parecem “esquecidas” pelo poder público.
“Cadê o apoio voltado para a comunidade rural? Atendo 29 povoados, vilas, assentamentos e acampamentos, e nossa equipe de assistência está desfalcada. Frequentemente encontro pessoas do campo que necessitam de atendimento psicológico”, reforça Silvia.
Na terceira e última mesa, “Juventude, Mulheres e Agroecologia para um Município Sustentável”, a agroecologia foi discutida não só como uma prática de produção sustentável no campo, mas também como uma filosofia de vida dos povos, um modo de ser e viver no campo.
“A ciência nos afirma que a agroecologia é uma ciência. Mas, para nós, que não vivemos somente da ciência, mas também dos conhecimentos tradicionais, entendemos que a agroecologia, além de ser uma ciência, é um jeito de viver, uma filosofia de vida, uma forma de produzir alimentos de maneira saudável e de construir uma relação harmônica com a natureza. Nossos ancestrais não usavam o conceito de agroecologia, mas já a praticavam desde muito antes”, descreve o educador popular Andrade.
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