O Movimento pelas Serras e Águas de Minas vem a público manifestar sua solidariedade à paralisação e reivindicações dos mineiros de Itabira e manifestar as seguintes posições:
– A atual crise financeira internacional expôs o nível de irresponsabilidade e a irracionalidade do processo de abertura de minas por empresas como a Vale, processo sustentado pela conivência e “parceria” de agentes do Estado e da União; – A proporção que tal processo adquiriu colocou a atividade da mineração em franca oposição a qualquer perspectiva de sustentabilidade dos modos de vida de comunidades e da preservação do patrimônio coletivo natural, cultural, paisagístico e dos mananciais armazenados na região central de Minas Gerais, sabidamente consorciados com muitas das jazidas ferríferas exploradas e visadas; – Se tal medida de “crescimento” concorre para a macropolítica comercial brasileira, é inegável que a ausência de limites éticos e de cultura de gestão pública territorial e ecológico-econômica será a herança maldita das próximas gerações. Em Minas Gerais, estamos assistindo à reprise do que aqui ocorreu no final do século XVIII;
– A gula do mercado de expropriação de valores naturais, que muito ultrapassam o significado imediato da mercadoria ferrífera, tem possibilitado um processo de acumulação fundiária e de dominação política incompatíveis com o Brasil democrático e justo que queremos; têm alimentado uma cadeia de negócios que ameaça a soberania e dignidade de nosso povo, de regiões e municipalidades. Esta cadeia desenfreada e carente de princípios morais tem conduzido o Brasil, Minas Gerais e seus governantes, de maneira geral, a legitimarem e praticarem ações perversas, como:
– A da permissão ou favorecimento de atividades de mineração em áreas de recarga e de captação de mananciais de abastecimento público; A transformação do conceito de recuperação ambiental em negócios imobiliários e de adensamento populacional em áreas que deveriam ser restituídas ao uso comum; A monopolização e supressão de linhas de transporte ferroviário de passageiros para uso exclusivo pelo transporte de cargas; A inviabilização da diversificação econômica de regiões como a do centro histórico e populacional de Minas Gerais, propensas ao turismo e à fixação de indústrias de ponta – o que sujeita à vulnerabilidade e decadência, diante da política de terra arrasada, cidades como Itabira, Congonhas, Mariana e Santa Bárbara, entre outras; A deterioração dos princípios públicos, por gestores e políticas ambientais, que passaram a ser instrumentos para favorecer aos megaempreendedores; A transformação dos escritórios destas grandes empresas em balcões de atendimento das demandas dos “gestores” dos interesses públicos, numa total inversão da premissa da transparência e da autonomia política que deveria nortear as atividades de governantes e representantes da sociedade;
– O atropelamento dos princípios constitucionais e legais conquistados para a preservação do bem comum como as águas, o patrimônio biológico, arqueológico, paleontológico e espeleológico – que vêm sendo dinamitados pela cultura da lucratividade absurda de um segmento, em desmedida oposição ao equilíbrio econômico e social da coletividade e da nação.
Sabemos que tal ordem de coisas não foi criada para atender à demanda dos mineiros e demais trabalhadores que sobrevivem da atividade e que desejam exerce-la honradamente. Mas a forma gananciosa como a exploração das riquezas minerais vem sendo licenciada e operada, muito destacadamente nos últimos anos, é geradora de insegurança constitucional, social e ambiental, da criação de dependência, de passivos ambientais nunca reparados, de instabilidade psicológica e falta de horizontes para comunidades, famílias e indivíduos das localidades mais atreladas a estas atividades.
O Movimento pelas Serras e Águas de Minas conclama a uma reflexão profunda sobre atividades que, por sua exauribilidade, não mais podem se perpetuar de forma desequilibrada e em desrespeito a outros valores caros ao aprimoramento social de nosso Estado e do País. Para mudar a perspectiva suicida, só nos resta o difícil caminho da mudança política e cultural. As fantasias do mercado e a publicidade enganosa tentam passar ao mundo ilusões quanto a um modelo e a uma mentalidade administrativa centralista e consumidora que só fazem afundar mais e mais as possibilidades de sobrevivência de toda a sociedade.
A nau desgovernada reflete-se na postura de dirigentes de empresas, que ora falam em relativização de direitos, ora em ajustamento e reacomodação dos negócios e estruturas organizacionais, frente à crise.
Não há passes de mágica para reparar tal estado de coisas. São nossas propostas:
· Que, além dos caminhos apontados pelo Metabase, nos quais destacamos a redução da jornada de trabalho semanal para 36 horas, as atividades de suspensão de atividades de minas não sejam manipuladas para, submetendo-se à estratégia de obtenção de “direitos minerários” pelos empreendedores (quaisquer que sejam), darem lugar à abertura de novas minas, destacadamente de empreendimentos que atentam de forma inquestionável contra a preservação de monumentos naturais e de áreas vitais para a perpetuação das condições de qualidade e volume do abastecimento público de águas;
· Que as atividades de suspensão de lavras, caso ocorram, sejam seguidas dos necessários processos de descomissionamento de minas, com a devida participação do trabalhador mineiro no trabalho do descomissionamento, e da sociedade na aprovação e fiscalização dos projetos e processos de encerramento de atividades. Que, além disso, tais processos sejam cercados de garantias de promoção de atividades de formação profissional e de fomento empreendorístico, baseados em vontades e perspectivas de desenvolvimento definidas pelas próprias comunidades e habitantes da região, e não pelos que não fazem outra coisa senão monopolizar os caminhos do desenvolvimento local e regional;
· Que a categoria representada pelo Sindicato Metabase repudie a forma irresponsável com que o governo do Estado tem atraído negócios do segmento minero-siderúrgico para Minas Gerais, sem avaliação das graves conseqüências sociais, urbanísticas e ambientais que tais negócios acarretarão, em médio e longo prazos, para a qualidade de vida, as relações de trabalho e a sustentabilidade de toda a região.
Janeiro de 2009,
Movimento pelas Serras e Águas de Minas