Quais interesses um Cônsul americano teria com uma comunidade quilombola no Maranhão?
24 de outubro, 2016

Em matéria divulgada pela assessoria de imprensa do Governo do Maranhão, o motivo da visita seria uma reunião de negócios, mas para a comunidade quilombola o assunto foi outro.

consul_1_custom_-8521a-4711865 Durante os dias 29 e 30 de agosto, esteve presente no Palácio dos Leões, sede do governo do Maranhão, o Cônsul-geral dos Estados Unidos, Richard Reiter, e sua comitiva do consulado americano. Em matéria divulgada pela assessoria de imprensa do governo, o motivo da visita seria o desenvolvimento de projetos e programas, além da utilização do potencial logístico do Porto do Itaqui e a intensificação de investimentos norte-americanos na logísticas do Porto do Itaqui, em São Luís, como a ampliação dos berços para aumentar a movimentação de cargas, e as ligações ferroviárias que o Maranhão possui com a Região do Arco Norte do Brasil.

Pois bem, nos dia seguintes à reunião com o governador, o cônsul e sua comitiva visitaram uma comunidade quilombola no município de Itapecuru-Mirim (MA), justamente esta comunidade que está às margens da Ferrovia Carajás. Quando indagados sobre o motivo de sua presença na comunidade, o cônsul explicou ser uma visita para conhecer melhor as condições em que vivem as pessoas, para produção de um relatório sobre Direitos Humanos, que será apresentado ao Congresso americano, e representam uma importante fonte de informação para a formulação da política e da assistência externa do governo dos EUA. Também funciona como referência para outros governos, instituições internacionais, organizações não governamentais, profissionais da área jurídica, estudiosos, cidadãos interessados e jornalistas.

Atualmente, os trens que passam pela Estrada de Ferro Carajás (EFC) fazem transporte de soja e outros grãos, líquidos (combustíveis e fertilizantes, entre outros), além da sua principal carga, minério de ferro, juntos, correspondem 120 milhões de toneladas transportadas e 350 mil passageiros por ano, para tanto, circulam cerca de 35 composições simultaneamente, entre os quais um dos maiores trens de carga em operação regular do mundo, com 330 vagões e 3,3 quilômetros de extensão, que transporta minério de ferro .A Estrada de Ferro Carajás (EFC) possui um intenso fluxo, por estar interligada ainda com outras duas ferrovias: a Companhia Ferroviária do Nordeste (CFN) e a Ferrovia Norte-Sul. A primeira atravessa, principalmente, sete estados da região Nordeste e a segunda corta os estados de Goiás, Tocantins e Maranhão, facilitando a exportação de grãos produzidos no norte do estado do Tocantins pelo Porto de Ponta da Madeira, no Maranhão.

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Além da construção do relatório sobre direitos humanos, a visita do cônsul americano é também muito oportuna, para saber se há interdições na Estrada de Ferro Carajás, por onde passam todos os dias carregamentos até o Porto do Itaqui, e se há algum tipo de intervenção que possa gerar prejuízos financeiros, na contrapartida de investimentos americanos. Durante sua estada na comunidade, lideranças quilombolas de Santa Rosa dos Pretos relataram seu modo de vida e as dificuldades enfrentadas e, o sofrimento vivido por eles desde a construção da EFC e da Rodovia Federal que cortam seu território .

Conhecida por sua luta contra a empresa Vale S.A., que tem a concessão da EFC, Santa Rosa dos Pretos interditou a ferrovia, em reivindicação dos seus direitos e para dar visibilidade aos impactos que vinha sofrendo, como conta um dos moradores mais antigos do quilombo, seu Libâneo Pires “Quando a Vale chegou aqui foi com uma conversa que iria trazer desenvolvimento, pensávamos que o trem iria passar e levar as famílias para capital, a geração do meu pai cedeu a proposta da empresa, mal sabíamos, que ia matar pessoas, animais. Começamos a pensar que a Vale não veio trazer benefícios, mas sim prejuízos”, explicou.

Sendo em vista do “Relatório de Direitos do Consulado” ou uma sondagem sobre risco de investimentos, o Cônsul americano pôde perceber o nível de organização popular da comunidade e de outras tantas que apresentam problemas similares, e que só são ouvidas ou enxergadas, quando se manifestam por meio de protestos.

Por Lidiane Ferraz